O legislador pátrio tem
sido omisso no legislar, nestes domínios, por iniciativa própria.
Quando o faz, fá-lo menos
bem: prolífero nas normas, prolixo nos conteúdos!
Sob a batuta da União
Europeia [que continua a legislar muito e mal, valha a verdade] assinale-se,
sem se pretender ser exaustivo, o que a lume veio nos últimos tempos, com
alterações pontuais:
§
Lei-Quadro de Defesa do Consumidor
§
Lei das Condições Gerais dos
Contratos
§
Lei dos Contratos à Distância e
Fora do Estabelecimento
§
Lei das Práticas Comerciais
Desleais
§
Lei dos Preços
§
Lei das Vendas com Redução de
Preços
E
a Directiva Omnibus, de que as
alterações são mera decorrência, só foi parcialmente transposta. Prosseguem os
mais trabalhos preparatórios.
Mas
em razão de directivas outras, tivemos novidades legislativas no domínio das
Garantias dos Bens de Consumo, nas Comunicações Electrónicas, na Carta dos
Direitos Fundamentais na Era Digital…
E
o legislador interveio, autonomamente, um bom par de vezes na Lei das Condições Gerais dos Contratos que,
de forma tão atabalhoada, de cada vez que o fazia não sabia se era a quarta, a quinta ou a sexta das
alterações introduzidas…
A
Lei da Comissão das Cláusulas Abusivas,
necessária, mas muito mal ‘amanhada’ no Parlamento, deixou de todo a ideia da
ignorância sobre leis com que se cosem os da Casa.
E
ainda no que tange à Lei das Linhas
Telefónicas para Contacto dos Consumidores com os Fornecedores: em que, ao revogar um artigo da Lei-Quadro de
Defesa do Consumidor, por dúvidas interpretativas acerca de “tarifa base” e “tarifa de base”, se deu à
luz um diploma legal com 11 artigos, numa imensa perturbação dos quadros
normativos. E no afã de legislar, legislar, legislar muito, mal, e sem sentido.
Com
a perturbação que tudo isso causa.
Já
sem falar das linhas para contactos com os serviços da Administração Pública… e
do seu regime!
Quando
seria fácil encetar-se a via para a criação de um Código de Direito do Consumo, o mais abrangente possível, cujas
alterações pontuais se introduziriam no seu próprio texto à medida que fossem
surgindo, como o fazem, aliás, os franceses no seu “code de la consommation”.
Houve
uma iniciativa gorada no tempo de Elisa Ferreira, como ministra do Ambiente, e
um aborto legislativo saído das mãos de não especialistas que toda a comunidade
jurídica abjurou, e a que Fernando Serrasqueiro, ao tempo Secretário Adjunto da
Economia e da Defesa do Consumidor – e
bem – fez um veto de gaveta. E nunca mais se pensou em algo que não pode ser
feito por amadores, mas por especialistas e escassos são os que se exibem entre
nós por negligência da própria Universidade… que parece não cultivar regular e
consequentemente o direito do consumo, com uma excepção, porém, ao que se julga
saber, no panorama jurídico nacional.
Antes
de nos fixarmos na Lei das Condições
Gerais dos Contratos, convém dizer que Portugal terá de transpor até ao Dia de Natal a Lei da Acção Colectiva Europeia para tutela dos interesses
individuais homogéneos dos consumidores, dos interesses colectivos em sentido
estrito e dos interesses difusos.
Não
há notícia de eventuais avanços nesse particular. E seria uma óptima
oportunidade para se regulamentar a Acção
Inibitória Geral, que a Lei-Quadro de Defesa do Consumidor prevê desde 31
de Julho de 1996, e jamais se regulamentou, já lá vão mais de 26 anos… Por
culpa de sucessivos Governos e, em particular, de Vera Jardim, enquanto
ministro da Justiça de um deles.
Esta
é a imagem de marca do legislador português: a de um relapso e contumaz agente
que se está ‘borrifando’, passe o termo, para os direitos das gentes…
Mas
fixemo-nos agora na Lei que cria a
Comissão das Cláusulas Abusivas.
O
Parlamento deu 60 dias, por lei de 27 de
Maio de 2021, para que o Governo pusesse de pé a Comissão das Cláusulas
Abusivas.
A
Comissão deveria estar estruturada e instalada a 26 de Julho de 2021. Para que
pudesse entrar plenamente em funcionamento a 25 de Agosto de 2021, data em que
a lei começaria a vigorar, segundo dispositivo próprio.
Passou
um mês, passaram dois e o Secretário de Estado, iludindo a realidade, dizia –
com enorme desfaçatez e suma incompetência - que o prazo de 60 dias só
principiaria da data do começo de vigência da lei.
Nem
sessenta dias nem seis meses e, pelos vistos, nem 600 dias… chegam para pôr cá
fora a Comissão das Cláusulas Abusivas.
Com
os Serviços de Injunção em Matéria de Arrendamento sucedeu algo
semelhante.
A
Lei 13/2019, de 12 de Fevereiro, criou no seio da
DGAJ, o Serviço de Injunção em Matéria de Arrendamento (SIMA), destinado a
assegurar a tramitação da injunção em um tal domínio.
E nela se estabelecia que “no prazo de 180 dias, o Governo aprovaria
por decreto-lei o regime do procedimento de injunção em matéria de
arrendamento…” O que apontaria para que o Serviço estivesse instalado e a
funcionar nos primeiros dias de Agosto de 2019.
O
tal diploma só veio a ser editado em 2021…
E em nota, o Ministério da Justiça, com algum despudor,
dizia a 10 de Dezembro de 2021:
A implementação integral deste serviço só
estará concluída no próximo ano, tendo sido estabelecido até 1 de Abril de 2022
um regime transitório para tramitação deste procedimento…”
O “Dia das Mentiras” sempre como marco!
E em Terras de Santa Maria… a cidadania “nem
tugia nem mugia”! E exalte-se a autocracia!
Mário Frota
presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO
-, Portugal