terça-feira, 14 de outubro de 2025

DIRE©TO AO CONSUMO - Rádio Valor Local


 “INFORMAR PARA PREVENIR

PREVENIR PARA NÃO REMEDIAR”

 PROGRAMA

DE

14.OUT.2025

 

VL

As Gigantes Tecnológicas (as Big Tech, como também se diz) andam na berlinda.

Não têm sido nada humildes as autoridades dos diferentes países nas condenações das Mega Tecnológicas, como Google, Meta, etc.

O rol é vasto.

Quer dar-nos uma nota mais pormenorizada do que tem sucedido ao Google?

MF

O Google tem enfrentado várias condenações, incluindo multas milionárias na Europa por recolha ilegal de dados e violação de privacidade, como as de $396 milhões de euros na Califórnia e $325 milhões de euros em França por falhas no consentimento de cookies. Além disso, foi condenado em Portugal a bloquear sites de pirataria e, no Brasil, por concorrência desleal na venda de palavras-chave no Google Ads.

Condenações por privacidade e dados

Califórnia, EUA: Em setembro de 2025, um tribunal federal condenou o Google a pagar cerca de $396 milhões de euros em indemnizações a aproximadamente 100 milhões de utilizadores. A decisão refere-se à recolha de dados privados mesmo depois de os utilizadores terem desativado a funcionalidade de rastreamento nos seus smartphones.

França: Em setembro de 2025, a autoridade francesa de proteção de dados (CNIL) multou o Google em €325 milhões por infraçcões relacionadas com cookies, nomeadamente por não obter consentimento livre e esclarecido antes de instalar cookies publicitários.

Brasil: A empresa foi condenada por permitir o acesso a websites de pirataria de filmes e séries.

Outras condenações

Concorrência desleal: O Google Brasil foi condenado a pagar uma indemnização a uma empresa devido à concorrência desleal, por ter vendido a marca de uma empresa concorrente como palavra-chave no Google Ads.

Bloqueio de sites: O Google Portugal foi obrigado a bloquear sites de streaming ilegal, após perder um recurso apresentado contra uma decisão do Tribunal da Relação de Lisboa.

E pode terminar com uns versos simples em que se censura Mark Zuckerberg, da Meta, que entende que o Regulamento Europeu lança uma onda de censura sobre os abastardados métodos que as gigantes tecnológicas, como a sua, adoptam no seu relacionamento com os usuários:

 

E as Plataformas digitais

Tal como são contempladas

Com descompassos abissais

São milionariamente multadas

 

A isso com descaramento

Há quem lhe chame censura

Pouca bola e muito tento

P’ra salvaguardar a cultura!

 VL

Pergunta-nos um consumidor se é normal que, ao ter comprado um computador de uma dada marca, que entretanto deixou de funcionar, a empresa que lho vendeu o mande procurar o  fabricante que, ainda por cima, responde de um “call center” situado em Itália. E de tal maneira que o problema parece não ter solução à vista.

 MF

Tratando-se de um contrato de compra e venda, é ao fornecedor que incumbe a obrigação de o garantir contra qualquer não conformidade: de harmonia com o n.º 1 do artigo 12 da Lei da Compra e Venda dos Bens de Consumo de 2021 (LGBC),

“o [fornecedor] é responsável por qualquer [não conformidade] que se manifeste no prazo de três anos a contar da entrega do bem.”

“O prazo para a reparação ou substituição não deve exceder os 30 dias, salvo nas situações em que a natureza e complexidade dos bens, a gravidade da não conformidade e o esforço necessário para a conclusão da reparação ou substituição justifiquem um prazo superior.” (LGBC: n.º 3 do art.º 18).

Há hoje em dia como que uma hierarquia no recurso aos remédios de que o consumidor pode lançar mão: “O consumidor pode escolher [em primeiro lugar, por via de regra] entre a reparação ou a substituição do bem, salvo se o meio escolhido para a reposição da conformidade for impossível ou, em comparação com o outro meio, impuser ao [fornecedor] custos desproporcionados, tendo em conta todas as circunstâncias…” (LGBC: n.º 2 do art.º 15)

 

E só poderá usar da redução adequada do preço ou pôr termo ao contrato em circunstâncias particulares, entre outros, se o fornecedor

 §  Não tiver efectuado a reparação ou a substituição, em termos gerais;

 §  Não tiver efectuado a reparação ou a substituição, de harmonia com os condicionalismos legais;

 §  Tiver recusado repor a conformidade dos bens e tal for impossível ou impuser encargos desproporcionados; ou

 §  Tiver declarado, ou resultar com evidência das circunstâncias, que não reporá os bens em conformidade em prazo razoável ou sem grave inconveniente para o consumidor (LGBC: n.º 4 do artigo 15)

 Poderá, porém, sem mais, nos casos em que a não conformidade se manifestar no lapso de 30 dias após a entrega do bem, exigir a imediata substituição do bem ou pôr termo ao contrato: é o chamado “direito de rejeição” (LGBC: art.º 16).

É, porém, direito do consumidor (que não estrita imposição do fornecedor) o recurso ao produtor por meio de acção directa (algo de excepcional porque o contrato foi celebrado com o fornecedor) só – e tão só – nos casos de reparação ou substituição, em dadas circunstâncias (LGBC: n.º 1 do art.º 40). Que não nos de redução do preço ou extinção do contrato [o pôr termo ao contrato].

Dos prejuízos que da recusa (e do jogo do ‘empurra’) resultarem, cabe ainda a reparação dos danos, tanto materiais como morais que a situação é susceptível de acarretar (LDC: art.º 12)

A recusa, nestas hipóteses, de banda do fornecedor é passível de constituir, em dados termos, um ilícito de mera ordenação social, constituindo contra-ordenação económica grave, sujeita a coima e a sanções acessórias, de harmonia com o que estabelece o Regime Jurídico das Contra-Ordenações Económicas de 29 de Janeiro de 2021.

  VL

Mas poderá então recorrer ao fabricante, ao produtor, como acaba de dizer, não é assim?

 MF

É facto. Mas repare no que se disse:

“É, porém, direito do consumidor (que não estrita imposição do fornecedor) o recurso ao produtor por meio de acção directa (algo de excepcional porque o contrato foi celebrado com o fornecedor) só – e tão só – nos casos de reparação ou substituição, em dadas circunstâncias (LGBC: n.º 1 do art.º 40). Que não nos de redução do preço ou extinção do contrato [o pôr termo ao contrato].”

O consumidor pode fazê-lo por sua alta recriação, por iniciativa sua, que não por imposição do fornecedor, do vendedor, que o que quer é descartar-se de responsabilidades. E isso a lei não oconsente!

 VL

E é o vendedor que tem de arcar com as despesas resultantes da reparação, por exemplo, ou da substituição, no limite?

MF

Nos termos da Lei da Compra e Venda de Consumo de 18 de Outubro de 2021,

“sempre que o fornecedor seja responsável perante o consumidor por uma não conformidade [e é o fornecedor que responde em primeira linha, como se disse], goza do direito de regresso contra a pessoa ou pessoas responsáveis nos elos da correspondente cadeia comercial, sejam distribuidores, sejam fabricantes.”

O fornecedor pode exercer o direito de regresso contra o distribuidor ou produtor na acção judicial que o consumidor houver de instaurar, se for o caso.

O direito de regresso caduca em cinco anos a contar da entrega do bem pelo distribuidor ou produtor.

O fornecedor deve exercer o seu direito no prazo de seis meses a contar da data da satisfação do direito ao consumidor.

 VL

O produtor ou fabricante será responsável, por exemplo, se se tiver limitado à garantia legal, ou seja, a de 3 anos, e o fornecedor, por sua alta recreação, oferecer, sem quaisquer encargos, uma garantia de 5 anos e o vício, o defeito, a avaria, a não conformidade, aparecer no quarto ano, por exemplo?

  MF

Não, de todo!

Nesse caso, o produtor só será responsável pelo que ocorrer dentro da garantia legal, que agora é de três anos, se bem que ao fim dos dois primeiros anos cesse a presunção de não conformidade imputável ao produtor e ao consumidor caiba a prova de que o que ocorreu do segundo para o terceiro ano é da responsabilidade do próprio produtor, coisa que, como se sabe, será extremamente difícil.

Mas os 2 anos que se seguem aos três primeiros competem ao vendedor, ao fornecedor, sem que ele se possa voltar contra o produtor, que fica desse modo resguardado porque não foi ele quem concedeu prazo mais dilatado, neste caso como garantia comercial.

 VL

E se, no limite, o consumidor quiser pôr termo ao contrato, aquilo a que a lei chama “resolver o contrato” [resolver o contrato não é aqui executar, cumprir o contrato; é, pelo contrário, pôr termo ao contrato, fazer cessar o contrato, extinguir o contrato, como resulta da lei], se quiser pôr termo ao contrato, que voltas tem de dar para o conseguir, a que requisitos tem o consumidor de obedecer?

MF

Exactamente, resolver o contrato é pôr termo ao contrato, é fazer cessar o contrato, é extinguir o contrato.

A lei diz nestas circunstâncias que:

O direito de resolução [de cessação, de extinção do contrato] é exercido através de declaração dirigida pelo consumidor ao fornecedor: consumidor informa o fornecedor da sua decisão de pôr termo ao contrato de compra e venda.

Tal declaração pode ser efectuada, diz a lei, designadamente, por carta, correio electrónico, ou por qualquer outro meio susceptível de prova, nos termos gerais.

Se a não conformidade, porém, respeitar a uma parte dos bens e se verifique fundamento para a resolução do contrato nos termos legais, o consumidor tem o direito a pôr termo ao contrato

na parte relativa ao bem não conforme ou a quaisquer bens adquiridos conjuntamente com o bem não conforme caso não seja razoavelmente expectável que o consumidor aceite a manutenção do contrato apenas com os bens conformes.

O exercício do direito de pôr termo ao contrato no seu conjunto ou em relação a alguns dos bens, determina:

§  A obrigação de o consumidor devolver os bens ao fornecedor, à custa deste;

 

§  A obrigação de o fornecedor reembolsar o consumidor do preço pago pelos bens após a sua recepção ou de prova do seu envio, apresentada pelo consumidor.

 O fornecedor deve efectuar o reembolso dos pagamentos através do mesmo meio de pagamento que tiver sido utilizado pelo consumidor na transacção inicial, salvo havendo acordo expresso em contrário e desde que o consumidor não incorra em quaisquer custos como consequência do reembolso.

No prazo de 14 dias a contar da data em que for informado da decisão de resolução do contrato, o fornecedor deve reembolsar o consumidor de todos os pagamentos recebidos, incluindo os custos de entrega do bem.

Sem prejuízo do que se acaba de dizer,  e salvo situações em que incumba ao fornecedor a recolha do bem, pode este proceder à retenção do reembolso enquanto os bens não forem devolvidos ou o consumidor não faça prova do seu envio.

O fornecedor deve proceder à remoção dos bens sempre que a extinção do contrato de compra e venda assim o exija, a título gratuito. 

 VL

Fala-se, muitas vezes, da garantia comercial, que acresce à garantia legal, que é agora, desde o primeiro dia de Janeiro de 2022, de três anos.

Mas quais as particularidades da garantia comercial?

Se num anúncio aparecer, como tantas vezes sucede, garantia de 5 ou 7 anos, sem mais, e se, depois, do contrato constar tão só a garantia legal de três anos, o consumidor terá de se conformar com a garantia legal? Pode processar o fornecedor ou a marca por publicidade enganosa?

 MF

Para além do que em matéria de publicidade se possa fazer, através de uma acção colectiva – quer se trate de acção inibitória, quer se trate de acção popular -, o consumidor pode, na concreta situação, exigir que a lei se cumpra pura e simplesmente.

Com efeito, a Lei-Quadro de Defesa do Consumidor, no n.º 5 do seu artigo 7.º, diz taxativamente que

“As informações concretas e objectivas contidas nas mensagens publicitárias de determinado bem, serviço ou direito consideram-se integradas no conteúdo dos contratos que se venham a celebrar após a sua emissão, tendo-se por não escritas as cláusulas contratuais em contrário.”

E na Lei Nova das Garantias se diz:

“Sempre que os termos e condições da declaração de garantia e da publicidade promovida nos termos precedentes não sejam coincidentes, o consumidor beneficia das condições mais favoráveis, excepto nos casos em que antes da celebração do contrato a publicidade tenha sido corrigida de uma forma idêntica ou comparável àquela pela qual foi anteriormente efectuada

Por conseguinte, é direito do consumidor exigir, sem mais, a garantia de 5 ou 7 anos, consoante os casos, podendo, inclusivamente, requerer uma indemnização pelos prejuízos morais ou materiais que a situação haja acarretado.

 VL

E as particularidades da garantia comercial?

  MF

A garantia comercial vincula o garante nos termos das condições previstas na declaração de garantia.

Nos casos em que o produtor oferece ao consumidor uma garantia comercial de durabilidade do bem durante um determinado período de tempo, o produtor é directamente responsável perante o consumidor pela reparação ou substituição do bem durante todo o período da garantia comercial.

A declaração de garantia comercial é entregue ao consumidor por escrito ou em qualquer outro suporte duradouro até ao momento da entrega do bem.

A declaração de garantia comercial deve ser redigida na língua portuguesa, em linguagem clara e inteligível, e incluir as seguintes menções:

§  A declaração clara de que o consumidor é titular dos direitos à reposição da conformidade, à redução do preço ou à extinção do contrato, de acordo com a lei, e de que esses direitos não são afectados pela garantia comercial; 

§  Informação clara e expressa acerca do objecto da garantia comercial, benefícios atribuídos ao consumidor por meio do exercício da garantia, bem como as condições para a atribuição desses benefícios, incluindo a enumeração de todos os encargos, nomeadamente os relativos às despesas de transporte, de mão-de-obra e de material, e ainda os prazos e a forma de exercício da garantia, inclusive a referência a quem incumbe provar a não conformidade e o prazo aplicável a tal ónus;

 §  O nome e o endereço do garante;

 §  O procedimento a seguir pelo consumidor para executar a garantia comercial;

 §  A designação dos bens aos quais a garantia comercial se aplica; e

 §  Duração e âmbito territorial.

Os direitos resultantes da garantia transmitem-se ao terceiro adquirente do bem a título gratuito ou oneroso.

 VL

 

Mas muitas vezes em lugar da garantia comercial, o que as empresas fazem é que os consumidores subscrevam um contrato de seguro e quando os problemas aparecem, remetem-nos para os seguradores que em termos de responsabilidade são sempre esquivos, Como ficamos aqui?

 MF

Esse é, com efeito, um dos logros em voga.

Mas o consumidor terá de denunciar tais situações, já que esse arremedo de garantia é-o em fraude à lei. E é preciso combate-lo veementemente.

segunda-feira, 13 de outubro de 2025

A RESPONSABILIDADE DOS PRESTADORES DOS MERCADOS EM LINHA PELA ACTUAÇÃO DOS PARCEIROS QUE SE SOCORREM DAS SUAS PLATAFORMAS DIGITAIS

 


O regime de pretérito: a Directiva do Comércio Electrónico de 08 de Junho de 2000 e sua interpretação pelo Tribunal de Justiça

A responsabilidade dos prestadores de mercado em linha pela actuação dos parceiros que se servem das respectivas plataformas, no seio do mercado de consumo, para comerciar produtos do mais diverso jaez, era algo que de algum modo se não afirmava inequivocamente ante o regime estabelecido em 2000 pela Directiva do Comércio Electrónico (2000/31/CE), com data de 08 de Junho de 2000 e a chancela do Parlamento Europeu.

Às abundantes fraudes perpetradas contra os consumidores sobrevinha, em princípio, a nula responsabilidade, como reacção primitiva da ordem jurídica com o cunho das instâncias legiferantes da União Europeia.

E as dúvidas adensavam-se porque, ao que parece, a Directiva do Comércio Electrónico de 2000 não dava uma resposta efectiva à questão, antes – no intuito de favorecer a expansão da sociedade digital – eximia de responsabilidades os prestadores dos mercados em linha, nas múltiplas actividades por que se desdobravam, como estímulo que jamais deveria ser jugulado.

No entanto, convém sublinhar que o Tribunal de Justiça da União Europeia, no Processo C‑324/09 (L’Oréal v. eBay), aclarara o conceito de “ter conhecimento”, consagrado no art.º 14 n.º 1 da referenciada Directiva.

Com efeito, “o TJUE considerou, na circunstância, que quando o prestador de serviços em rede, em vez de se limitar a uma prestação neutra, através de um processamento puramente técnico e automático dos dados fornecidos pelos seus clientes, desempenha um papel activo susceptível de lhe facultar um conhecimento ou um controlo dos dados, não deverá ser havido como prestador intermediário e beneficiar da isenção de responsabilidade, nos termos previstos na normativa atinente ao comércio electrónico. Ademais, é suficiente para levantar a cortina de irresponsabilidade que tal operador tenha tido conhecimento de factos ou de circunstâncias com base nos quais um operador económico diligente devesse ter a noção da ilicitude em causa.”

O TJUE esclarecera que o “conhecimento” deve ser interpretado in casu no sentido de qualquer situação em que “o prestador em causa toma conhecimento, por qualquer forma, de tais factos ou circunstâncias, abarcando as situações em que o operador de um sítio de comércio electrónico tem a noção da existência de uma actividade ou de uma informação ilegal na sequência de análise efectuada por sua própria iniciativa e em que a existência de uma tal actividade ou informação lhe é notificada”.

 “No segundo caso, se é verdade que de uma notificação não se pode retirar automaticamente o direito à isenção da responsabilidade sob análise, já que as notificações são susceptíveis de se revelar insuficientemente precisas e demonstradas, não menos certo é que constitui, regra geral, elemento que o juiz nacional deve tomar em devida conta na sua apreciação, tendo em consideração as informações transmitidas ao operador, a realidade do conhecimento por este dos factos ou das circunstâncias com base nos quais um operador económico diligente devesse dar-se conta da ilicitude.

Por outro lado, há que referir que o considerando 42 da Directiva 2000/31/CE esclarecia que as situações de exoneração de responsabilidade abrangiam exclusivamente os casos em que a actividade da sociedade da informação exercida pelo prestador de serviços revestisse carácter “puramente técnico, automático e de natureza passiva”, o que implicaria que o referido prestador de serviços “não [tinha] conhecimento da informação transmitida ou armazenada, nem o seu controlo”.

Neste contexto, o TJUE defendeu, no âmbito dos processos apensos C‑236/08 a C‑238/08 (Google France versus Louis Vuitton), que  - a fim de verificar se a responsabilidade do prestador de serviços da sociedade de informação poderia ser limitada - “deve examinar‑se se o papel desempenhado pelo referido prestador é neutro, ou seja, se o seu comportamento é puramente técnico, automático e passivo, implicando o desconhecimento ou a falta de controlo dos dados que armazena”.

Daí que cumpra fazer ressaltar este cambiante, que é de suma relevância no apuramento, em geral, de responsabilidade das plataformas matriz e na interpretação dos preceitos em apreciação.

 

O regime da Lei da Compra e Venda de Bens de Consumo, ora vigente em Portugal

Com a emergência da Lei da Compra e Venda dos Bens de Consumo (DL 84/2021, de 18 de Outubro), Portugal entendeu impor, em dados termos e de modo inequívoco, responsabilidades aos prestadores dos mercados em linha, nas relações jurídicas de consumo, algo que ali se estatuiu de forma expressa.

Com efeito, no seu artigo 44, uma tal disciplina se impôs, sob a epígrafe

“Responsabilidade do prestador de mercado em linha”:

“1.       O prestador de mercado em linha [uma qualquer empresa como as que abrem a sua plataforma a outras empresas, onde se oferecem produtos e serviços do mais diverso jaez), parceiro contratual do fornecedor  que coloca  no mercado produto, conteúdo ou serviço digital,  é solidariamente responsável, perante o consumidor, pela  não conformidade que neles se verifique.

2.         Considera-se que o prestador de mercado em linha é parceiro contratual do fornecedor sempre que exerça influência predominante na celebração do contrato, o que se verifica, designadamente, nas seguintes situações:

·         O contrato é celebrado exclusivamente através dos meios disponibilizados pelo prestador de mercado em linha;

 

·         O pagamento é exclusivamente efectuado através de meios disponibilizados pelo prestador de mercado em linha;

·         Os termos do contrato celebrado com o consumidor são essencialmente determinados pelo prestador de mercado em linha ou o preço a pagar pelo consumidor é passível de ser influenciado por este; ou

·         A publicidade associada é focada no prestador de mercado em linha e não nos fornecedores (como, em Portugal, no caso da FNAC, da Worten ou da OLX…).

1.    Podem ser considerados, para aferição da existência de influência predominante do prestador de mercado em linha na celebração do contrato, quaisquer factos susceptíveis de fundar no consumidor a confiança de que aquele tem uma influência predominante sobre o fornecedor que disponibiliza o bem, conteúdo ou serviço digital.

2.    O prestador de mercado em linha que não seja parceiro contratual de quem fornece o bem, conteúdo ou serviço digital deve, antes da celebração do contrato, informar os consumidores, de forma clara e inequívoca:

§  De que o contrato será celebrado com o fornecedor  e não com o prestador de mercado em linha;

§  Da identidade do fornecedor, bem como da sua qualidade de profissional ou, caso tal não se verifique, da não aplicação dos direitos previstos na lei; e

§  Dos contactos do fornecedor para efeitos de exercício dos enunciados direitos.

3.    O prestador de mercado em linha pode basear-se nas informações que lhe são facultadas pelo fornecedor, a menos que conheça, ou devesse conhecer, com base nos dados disponíveis relativos às transacções em plataforma, que tal informação é incorrecta.

O incumprimento do que se dispõe neste particular  determina a responsabilidade do prestador de mercado em linha.

O prestador de mercado em linha que, nos termos enunciados, se torne responsável perante o consumidor por declarações enganosas do fornecedor ou pelo incumprimento do contrato a este imputável, tem o direito de ser indemnizado pelo fornecedor, de acordo com a lei geral (opera neste passo o denominado ‘direito de regresso’).

No entanto, a lei em apreço não aparelha uma qualquer outra sanção pela inobservância dos deveres de cuidado que a responsabilidade pressupõe, como é usual, no quadro das denominadas contra-ordenações económicas passíveis de coima (montante em dinheiro) e de sanções outras, conceituadas como  acessórias.

O Regulamento do Mercado Único dos Serviços Digitais de 19 de Outubro de 2022

Entretanto, a 19 de Outubro de 2022, o Parlamento Europeu e o Conselho fizeram editar, no Jornal Oficial, o Regulamento (UE) 2022/2065, do ‘Mercado Único dos Serviços Digitais’, com modificações operadas na Directiva do Comércio Electrónico de 8 de Junho de 2000.

E aí estatuíram - no que à  responsabilidade dos prestadores de serviços intermediários tange - um conjunto de regras atinentes a três hipóteses precisas, a saber:

·         ao simples transporte,

 

·         à armazenagem temporária e

 

·         ao alojamento virtual,

que de todo importa considerar.

a.    No que se refere ao “simples transporte”, eis o que se observará doravante:

No caso de prestações de um serviço da sociedade da informação que consista na transmissão, através de uma rede de comunicações, de informações prestadas pelo destinatário do serviço ou em facultar o acesso a uma rede de comunicações, o prestador do serviço não é responsável pelas informações transmitidas ou acedidas, desde que:

·         Não esteja na origem da transmissão;

 

·         Não seleccione o destinatário da transmissão; e

 

·         Não seleccione nem modifique as informações objecto da transmissão.

As actividades de transmissão e de propiciamento de acesso no passo precedente enunciadas abrangem a armazenagem automática, intermédia e transitória das informações transmitidas, desde que tal armazenagem sirva exclusivamente para a execução da transmissão na rede de comunicações e a sua duração não exceda o tempo considerado razoavelmente necessário à referenciada transmissão.

Tal não afecta a possibilidade de uma autoridade judiciária ou administrativa, de acordo com o sistema jurídico do Estado-membro de que se trate, exigir do prestador de serviços que previna ou ponha termo a uma dada infracção.

b.    Nas hipóteses de “armazenagem temporária (o «caching»)”, eis o que ora se observa:

“Em caso de prestação de um serviço da sociedade da informação que consista na transmissão, através de uma rede de comunicações, de informações prestadas por um destinatário do serviço, o prestador do serviço não é responsável pela armazenagem automática, intermédia e temporária dessas informações, efectuada apenas com o objectivo de tornar mais eficaz ou mais segura a transmissão posterior das informações a outros destinatários do serviço, a rogo destes, desde que o prestador:

§  Não modifique as informações; 

 

§  Respeite as condições de acesso às informações;

 

§  Respeite as regras relativas à actualização das informações, indicadas de forma amplamente reconhecida e utilizada pelo sector;

 

§  Não interfira com a utilização legítima da tecnologia, tal como amplamente reconhecida e utilizada pelo sector, aproveitando-a para obter dados sobre a utilização das informações;  

 

§  Actue com diligência para suprimir ou bloquear o acesso às informações que armazenou, logo que tome conhecimento efectivo de que as informações foram suprimidas da rede na fonte de transmissão inicial, de que o acesso às mesmas foi bloqueado, ou de que uma autoridade judiciária ou administrativa ordenou tal supressão ou desactivação de acesso.

O disposto precedentemente não afecta, de novo, a possibilidade de uma autoridade judiciária ou administrativa, de acordo com o sistema jurídico do Estado-membro, exigir do prestador que previna ou ponha termo a uma dada infracção.

c.     Já no que tange ao denominado “alojamento virtual”, eis o que rege o instituto:

Em caso de prestação de um serviço da sociedade da informação que consista na armazenagem de informações prestadas por um destinatário do serviço, o prestador do serviço não é responsável pelas informações armazenadas a pedido de um destinatário do serviço, desde que:

§  Não tenha conhecimento efectivo da actividade ou conteúdo ilegal e, no que se refere a uma acção de indemnização por perdas e danos, não tenha conhecimento de factos ou de circunstâncias que evidenciem a ilegalidade da actividade ou do conteúdo; ou

 

§  A partir do momento em que tenha conhecimento da ilicitude, actue com diligência no sentido de suprimir ou desactivar o acesso aos conteúdos ilegais.

O que precede não é aplicável nos casos em que o destinatário do serviço actue sob autoridade ou supervisão do prestador.

O que se dispõe antecedentemente não afecta de análogo modo a faculdade de uma autoridade judiciária ou administrativa, de acordo com o sistema jurídico do Estado-membro a que respeitar, exigir do prestador que previna ou ponha termo a uma dada infracção.

A fim de beneficiar da isenção de responsabilidade pelos serviços de alojamento virtual, o prestador deverá, a partir do momento em que tome conhecimento efectivo de actividades ou conteúdos ilegais, ou se houver sido alertado para o facto, proceder com a diligência devida em termos de suprimir tais  conteúdos ou bloquear o correspondente acesso.

A supressão ou a desactivação do acesso efectuar-se-ão no  respeito pelos direitos fundamentais dos destinatários do serviço, incluindo o direito à liberdade de expressão e à informação.

Como se previne no preâmbulo do assinalado Regulamento, “o prestador pode tomar conhecimento efectivo dos conteúdos em causa, ou ser alertado para a natureza ilegal dos mesmos, através, nomeadamente, de investigações realizadas por iniciativa própria ou de notificações que lhe sejam apresentadas por pessoas ou entidades nos termos do Regulamento ora em vigor, contanto queque tais notificações sejam suficientemente precisas e adequadamente fundamentadas para permitir a um operador económico diligente identificar, avaliar e, se for caso disso, adoptar medidas, de forma razoável, contra os conteúdos alegadamente ilegais.

No entanto, um tal conhecimento efectivo ou a adequada advertência não pode ser considerado adquirido apenas pelo facto de o prestador ter conhecimento, em sentido geral, do facto de o seu serviço ser de análogo modo usado para armazenar conteúdos ilegais.

Além disso, o facto de o prestador indexar automaticamente informação carregada para o seu serviço, de dispor de uma função de pesquisa ou de recomendar informação com base nos perfis ou nas preferências dos destinatários do serviço não basta para provar que tal prestador tem um conhecimento «específico» das actividades ilícitas realizadas nessa plataforma ou dos conteúdos ilegais nela armazenados.

De harmonia com o que se contém nos consideranda do Regulamento, importa sublinhar que

“A isenção de responsabilidade não será aplicável nos casos em que o destinatário do serviço actue sob autoridade ou supervisão do prestador de um serviço de alojamento virtual.”

Se, v. g., o fornecedor de uma plataforma em linha que permite aos consumidores celebrar contratos à distância com comerciantes puder determinar o preço dos bens ou serviços oferecidos pelos comerciantes, poderá considerar-se que o comerciante actua sob a autoridade ou supervisão de uma tal plataforma em linha.

 

Exclusões no âmbito das relações jurídicas de consumo

As disposições precedentes -  no que tange à isenção de responsabilidade - não são aplicáveis  no quadro do direito do consumo e das relações jurídicas a tal subjacentes, contanto se trate de plataformas em linha que permitem aos consumidores celebrar contratos à distância com comerciantes, sempre que tais plataformas apresentem o elemento específico de informação ou permitam, de qualquer outra forma, que a transacção específica em causa induza um consumidor médio a acreditar que a informação, o produto ou o serviço objecto da transacção é fornecido pela própria plataforma em linha ou por um destinatário do serviço que actue sob a sua autoridade ou supervisão.

Aliás, tal se previne, de forma mais ampla, no preâmbulo do próprio Regulamento dos Serviços Digitais de 19 de Outubro de 2022 (Regulamento UE 2022/2065) ao considerar-se que

“a fim de assegurar a protecção efectiva dos consumidores quando efectuam transacções comerciais em linha que sejam objecto de intermediação, certos prestadores de serviços de alojamento virtual, nomeadamente plataformas em linha que permitam aos consumidores celebrar contratos à distância com comerciantes, não deverão poder beneficiar da isenção de responsabilidade aplicável aos prestadores de serviços de alojamento virtual previstos no … regulamento, na medida em que essas plataformas em linha apresentem as informações pertinentes relacionadas com as transacções em causa de uma forma que induza os consumidores a acreditarem que tais informações foram fornecidas por essas mesmas plataformas em linha ou por comerciantes que actuem sob a sua autoridade ou controlo, e que portanto essas plataformas em linha conhecem ou controlam as informações, mesmo que, na realidade, tal não seja o caso.”

“São exemplos desse comportamento, uma plataforma em linha não apresentar claramente a identidade do comerciante, tal como o exige o presente regulamento, uma plataforma em linha recusar divulgar a identidade ou dados de contacto do comerciante até após a celebração do contrato celebrado entre o comerciante e o consumidor, ou uma plataforma em linha comercializar o produto ou serviço em seu próprio nome, em vez de utilizar o nome do comerciante que irá fornecer esse produto ou serviço.

Neste contexto, deverá determinar-se, de forma objectiva, com base em todas as circunstâncias pertinentes, se a apresentação é passível de induzir um consumidor médio a acreditar que a informação em causa foi prestada pela própria plataforma em linha ou por comerciantes que actuem sob a sua autoridade ou supervisão.”

 

EM CONCLUSÃO

 

1.    As isenções de responsabilidade dos prestadores do mercado em linha (plataformas que oferecem o alojamento virtual a fornecedores outros) para que, com atenuações pontuais, apontava a Directiva do Comércio Electrónico de 08 de Junho de 2000, com tradução em normativos nacionais dos Estados-membros, estão – no que em particular tange às relações jurídicas de consumo -, em dados termos, ultrapassadas,

2.    Quer por normativo com a chancela do legislador pátrio – Lei de Compra e Venda de Bens de Consumo de 18 de Outubro de 2021 (DL 84/2021: art.º 44) – que  consagra expressamente uma tal responsabilidade, observados determinados requisitos,

3.    Quer por mor do Regulamento “Serviços Digitais” de 19 de Outubro de 2022, do Parlamento Europeu e do Conselho que consigna expressamente um tal desígnio no seu artigo 6.º

Rádio Valor Local - Direto ao Consumo


 O Google tem enfrentado várias condenações, incluindo multas milionárias na Europa por recolha ilegal. Em Portugal por bloquear sites de pirataria … (...)

Operação “Viajar sem pressa” fiscaliza velocidade e começa amanhã

 A campanha termina 20 de outubro.  

A Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR), a PSP e a GNR dão, na terça-feira, início à campanha Viajar sem pressa, para alertar os condutores para os riscos da condução em excesso de velocidade. 

Numa nota, as autoridades referem que a operação, inserida no Plano Nacional de Fiscalização (PNF) de 2025, é a décima das 11 campanhas de sensibilização e de fiscalização planeadas para este ano, a realizar mensalmente. A campanha termina 20 de outubro. 

Na nota, as autoridades lembram que o excesso de velocidade é uma das principais causas de acidentes nas estradas e é responsável por mais de 60% das infrações registadas. 

A ANSR, a GNR e a PSP recordam que a probabilidade de existirem vítimas mortais aumenta em função da velocidade a que circulam os veículos. 

 

Resistência aos antibióticos aumentou 40% entre 2018 e 2023 e é ameaça crescente

 
Uma em cada seis infeções bacterianas confirmadas em laboratório e que causaram em 2023 doenças comuns em pessoas de todo o mundo eram resistentes aos tratamentos com antibióticos, segundo um novo relatório OMS. 

A resistência aos antibióticos aumentou em mais de 40% entre 2018 e 2023, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), que avisa que este crescimento representa uma ameaça crescente para a saúde global.

Uma em cada seis infeções bacterianas confirmadas em laboratório e que causaram em 2023 doenças comuns em pessoas de todo o mundo eram resistentes aos tratamentos com antibióticos, segundo um novo relatório OMS.

Segundo a organização, entre 2018 e 2023, a resistência aos antibióticos aumentou em mais de 40% dos antibióticos monitorizados, com um aumento médio anual de 5 a 15%. Ler mais

Há um novo apoio para jovens desempregados. Ouça o podcast “Ao trabalho!”

 


O podcast "Ao trabalho!" traz-lhe as notícias que estão a marcar o mercado de trabalho, dos salários às novas tendências, todas as quintas-feiras.

Os jovens desempregados que encontrem um novo posto de trabalho vão poder acumular uma parte do subsídio com o novo salário, ao abrigo do novo incentivo ao regresso ao trabalho. Este é um dos temas do novo episódio do podcast “Ao trabalho!”, que todas as quintas-feiras lhe leva os principais destaques do mundo laboral em menos de cinco minutos.

Esta semana, falamos também sobre os trabalhadores dispensados durante o período experimental e ainda sobre o impacto das mudanças no IRS no rendimento líquido dos portugueses. Ler mais

Segurança Social tem mais de 60 apoios disponíveis. E há um simulador que lhe diz se tem direito

A Segurança Social tem mais de 60 apoios diferentes disponíveis para ajudar os cidadãos. Há apoios para pessoas com fracos recursos financeiros, cuidadores informais, com incapacidades, desempregados, para pais, mães e morte e reforma. O Contas Connosco reuniu informação sobre o tema.

Para saber a que apoios tem direito existe o “Simulador de prestações sociais”.Das mais de 60 prestações disponíveis, estão abrangidas no simulador mais de 40. As que ainda não estão abrangidas são tão específicas que vão ser incluídas mais tarde para não atrasar o projecto.

Para preencher o simulador tem de ter ao seu lado as seguintes informações:

O seu IRS mais recente com o valor bruto, ou a Declaração da Segurança Social com o dinheiro que recebeu em pensões ou apoios (está na Segurança Social Direta).

A soma de todo o património mobiliário, ou seja, todo o dinheiro que tem em depósitos bancários, à ordem e a prazo, certificados de aforro, ações e PPR.

E o Grau de incapacidade ou deficiência, se for aplicável.

Economia de A a Z

 No programa de hoje e tendo em conta o Natal, falamos da economia do dar e receber vai muito além das transações financeiras. Assenta em ...