Aliás, tais preocupações [as de um peculiar desvelo face às distintas camadas de vulneráveis ou hipervulneráveis] arrancam (da) e remontam à Nova Agenda Europeia do Consumidor que a lume veio a 13 de Novembro de 2020, como sem dificuldade se pode alcançar da leitura do óbvio no seu ponto 3.4. ”Dar resposta às necessidades específicas dos consumidores”, a saber,
“…certos grupos de consumidores podem, em determinadas situações, ser particularmente vulneráveis e necessitar de salvaguardas específicas.
A vulnerabilidade dos consumidores pode ser determinada em função de circunstâncias sociais ou de características específicas de consumidores individuais ou de grupos de consumidores, tais como a idade, o género, a saúde, a literacia digital, a numeracia ou a situação financeira. A falta de acessibilidade pode colocar os idosos ou as pessoas com deficiência em situações de exclusão ou limitar as suas interacções. Estas formas de vulnerabilidade podem ter sido exacerbadas pela actual pandemia, mas existem independentemente da mesma.
… Actualmente, a crescente vulnerabilidade financeira de muitos agregados familiares da UE é especialmente preocupante.
…
A acessibilidade dos preços é crucial para garantir o acesso a produtos e serviços pelos consumidores de baixos rendimentos, como sublinhado pela Rede Europeia de Política Social…
… A Recomendação da Comissão sobre a pobreza energética proporciona aos Estados-membros orientações sobre as formas de combater a pobreza energética, a fim de capacitar os consumidores de energia vulneráveis.
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Os idosos e as pessoas com deficiência têm necessidades específicas em matéria de consumo. É importante assegurar a disponibilidade de informações claras, simples e acessíveis em linha e fora de linha, em conformidade com os requisitos da UE em matéria de acessibilidade dos produtos e serviços.
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As crianças e os menores estão particularmente expostos em linha a práticas comerciais enganosas ou agressivas.
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As crianças estão também particularmente expostas aos riscos relacionados com os produtos…
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A Directiva 2004/113/CE95 garante a igualdade de tratamento entre homens e mulheres no acesso a bens e serviços e seu fornecimento. Tal garante a protecção contra, por exemplo, a recusa de acesso a serviços de crédito para mulheres grávidas, com base numa potencial perda de rendimento esperada, ou a exclusão de mães solteiras de determinados serviços financeiros com base numa percepção de risco de incumprimento mais elevada. A Directiva 2000/43/CE96 também estabelece um quadro jurídico para o combate à discriminação com base na origem racial ou étnica, com vista a pôr em prática nos Estados-Membros o princípio da igualdade de tratamento.
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O risco de discriminação é por vezes agravado pelos algoritmos utilizados por certos fornecedores de bens e serviços e que podem ser formulados com base em preconceitos muitas vezes resultantes de expectativas culturais ou sociais preexistentes.
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Por último, os dados da economia comportamental mostram que os comportamentos dos consumidores são frequentemente afectados por preconceitos cognitivos, especialmente em linha, que podem ser explorados pelos operadores para fins comerciais. Estas novas formas de riscos podem afectar praticamente todos os consumidores. As obrigações de transparência são certamente importantes para combater as assimetrias de informação (tal como referido acima no contexto da transformação digital), mas é necessária uma avaliação mais aprofundada para determinar a necessidade de medidas adicionais para fazer face a esta forma dinâmica de vulnerabilidade.”
Daí que nada de surpreendente pareça ocorrer face ao que as instâncias da União Europeia se propõem, aliás, no quadro da Nova Agenda Europeia do Consumidor (Plano Quinquenal de Acção 2021/2025) que a lume veio a 13 de Novembro de 2020.
Ponto é saber como é que se articularão, afinal, tais medidas com as que, ao longo do quinquénio, a Comissão Europeia se propõe executar, no âmbito de um programa criteriosamente modelado.
Portugal carece, com efeito, de uma política de consumidores, ante os quadros de pungente miséria que se abatem com a comunidade nacional.
E a que tornaremos com a revelação de números de estarrecer, como os que emergem da Rede Europeia Anti-Pobreza que deixam corados de vergonha os rostos dos que há 50 anos vêem avolumando pobreza e miséria em lugar de a combater veemente e efectivamente!
Mário Frota
Presidente do Instituto Luso-Brasileiro de Direito do Consumo