CONSULTÓRIO
DO CONSUMIDOR
“as
Beiras”
(consultório
que deveria ter sido publicado hoje, sexta-feira, 03 de Março de 2023, nas
páginas do diário ‘As Beiras’, e que entretanto não o foi)
“A
mão que afaga é a mesma que apedreja”?
E
se comprou em Lisboa
E
o recusam em Peniche
Parece
que a lei mal soa…
E
tudo o mais que se “lixe”!
“Comprei um fogão na
Worten, em Lisboa. Mas como moro em
Peniche, precisava de o trocar nesta loja, algo que já fiz no passado. No
entanto, agora dizem-me que tenho de enviar o electrodoméstico para Lisboa e que o transporte é por minha conta. Qual é
a lei que rege este tipo de vontades? O que posso fazer?”
Ante uma tal
factualidade, cumpre oferecer a solução que da lei emerge:
1.
Ao comprar, decerto que forneceu os
dados pessoais, quanto mais não seja porque uma compra do estilo envolve, ao
menos, uma garantia legal.
1.1.E, por isso,
sabia de antemão a Worten que a
assistência se não prestaria no lugar da compra, a saber, em Lisboa, mas no do
domicílio, em Peniche.
1.2.E, quando
vende em tais condições, assume as obrigações que da lei decorrem.
2.
A Lei das Garantias dos Bens de Consumo de 2021 afirma expressamente,
no n.º 1 do seu artigo 18:
2.1.Para efeitos
de reparação ou substituição, o consumidor deve disponibilizar os bens, a
expensas do fornecedor.
2.2.E que a reparação ou a substituição se processa:
2.2.1.
A
título gratuito;
2.2.2.
Em
prazo razoável a contar do momento em que o
consumidor haja dado a saber da não conformidade;
2.2.3.
Sem
grave inconveniente, tendo em conta a natureza e a finalidade
a que se destina.
3.
Ora, nos temos da alínea a) do seu
artigo 2.º, “a título gratuito” é:
“livre
dos custos necessários incorridos para repor os bens em conformidade, nomeadamente
o custo de porte postal, transporte, mão-de-obra ou materiais”.
4.
Logo, o transporte é simplesmente
a expensas da Worten.
5.
O prazo para reparação ou substituição
não deve exceder os 30 dias, salvo
se a natureza e complexidade do remédio a adoptar, a gravidade da não
conformidade e o esforço necessário para a reposição justifiquem prazo
superior.
6.
Em caso de reparação, há um prazo adicional de seis meses por cada uma
das operações até ao limite de quatro, devendo o fornecedor, aquando da sua
devolução, fazer disso ciente o consumidor.
7.
Quando a reparação exigir a remoção do bem instalado de forma
compatível com a natureza e finalidade antes de a não conformidade se ter
manifestado, a obrigação do fornecedor abrange a remoção do bem não conforme e
a sua instalação, uma vez reparado ou substituto, a expensas suas.
8.
Se ocorrer a substituição, o fornecedor responde por qualquer não conformidade no bem
sucedâneo pelo decurso da garantia (dois anos até 31 de Dezembro de 2021, três
anos a partir do 1.º de Janeiro de 2022).
9.
“Em
caso de substituição do bem, não pode ser cobrado ao consumidor qualquer custo
inerente à normal utilização do bem substituído.”
10. Por
conseguinte, para além do mais, é de má
política comercial que um estabelecimento do estilo, funcione em jeito de “competência estanque”: “que o que se compra
em Lisboa se não ‘saiba’ em Peniche”!
11. Porque as grandes insígnias, dotadas de cultura
empresarial, não serão grandes se não cuidarem, se não zelarem pelos direitos dos
consumidores.
EM
CONCLUSÃO:
a.
Os encargos inerentes ao transporte,
em caso de reparação ou substituição do bem, suporta-os o fornecedor [DL
84/2021: al. a) do n.º 1 do art.º 18;
al. a) do art.º 2.º].
b.
É lícito ao consumidor recorrer
a qualquer estabelecimento de uma dada insígnia [dos que se disseminam pelo
país] sem que se justifique a recusa da aceitação do bem não conforme para a
reposição de conformidade.
c.
Caso tal ocorra, importa dar do facto
nota no Livro de Reclamações para os
efeitos devidos.
Este é, salvo melhor
juízo, o nosso parecer.
Mário
Frota
presidente emérito da
apDC – Direito do
Consumo -
Portugal