(artigo de opinião mensal publicado
no diário “As Beiras” de 13 de Fevereiro de 2023)
Um Código de Direitos do Consumidor
enxuto, por contraposição a um emaranhado de leis pluriformes, prolíferas,
prolixas, eis o que de há muito se exige, sem sucesso, porém.
Um exemplo:
Conteúdos digitais
dispensados e debitados à revelia do consumidor.
Dispositivos que, de
modo esparso, se aplicam a uma tal factualidade:
Lei
24/96: n.º 4 do art.º 9.º
Direito à protecção
dos interesses económicos
“O consumidor não
fica obrigado ao pagamento de bens ou serviços que não tenha prévia e
expressamente encomendado ou solicitado, ou que não constitua cumprimento de
contrato válido, não lhe cabendo, do mesmo modo, o encargo da sua devolução ou
compensação, nem a responsabilidade pelo risco de perecimento ou deterioração
da coisa.”
DL
57/2008: art.º 28
Fornecimento de bens
não solicitados
“1 - É proibida a
cobrança de qualquer tipo de pagamento relativo a fornecimento não solicitado
de bens, água, gás, electricidade, aquecimento urbano ou conteúdos digitais ou
a prestação de serviços não solicitada pelo consumidor, excepto no caso de bens
ou serviços de substituição fornecidos em conformidade com o n.º 4 do artigo
19.
2 - Para efeitos do
disposto no número anterior, a ausência de resposta do consumidor na sequência
do fornecimento ou da prestação não solicitados não vale como consentimento.”
Lei
24/96: art.º 9.º-A
Pagamentos
adicionais
1 - Antes de o
consumidor ficar vinculado pelo contrato ou oferta, o fornecedor de bens ou
prestador de serviços tem de obter o acordo expresso do consumidor para
qualquer pagamento adicional que acresça à contraprestação acordada
relativamente à obrigação contratual principal do fornecedor de bens ou prestador
de serviços.
2 - A obrigação de
pagamentos adicionais depende da sua comunicação clara e compreensível ao
consumidor, sendo inválida a aceitação pelo consumidor quando não lhe tiver
sido dada a possibilidade de optar pela inclusão ou não desses pagamentos
adicionais.
3 - Quando, em lugar
do acordo explícito do consumidor, a obrigação de pagamento adicional resultar
de opções estabelecidas por defeito que tivessem de ser recusadas para evitar o
pagamento adicional, o consumidor tem direito à restituição do referido
pagamento.
4 - Incumbe ao
fornecedor de bens ou prestador de serviços provar o cumprimento do dever de
comunicação estabelecido no n.º 2.
5 - O disposto no
presente artigo aplica-se à compra e venda, à prestação de serviços, aos
contratos de fornecimento de serviços públicos essenciais de água, gás, electricidade,
comunicações electrónicas e aquecimento urbano e aos contratos sobre conteúdos
digitais.”
Lei
16/23: art.º 125
Cobrança de bens ou
serviços de terceiros
1 — … as empresas que oferecem serviços de acesso à
Internet ou serviços de comunicações interpessoais com base em números
acessíveis ao público só podem exigir aos utilizadores finais o pagamento de
bens ou serviços que não sejam de comunicações electrónicas e não façam parte da
oferta que o utilizador final contratou, quando estes tenham prévia, expressa e
especificamente autorizado a realização do pagamento de cada um dos referidos
bens ou serviços, através de declaração em qualquer suporte duradouro.
2 — A declaração
referida no número anterior deve ser conservada pelas empresas durante o
período de vigência do contrato, acrescido do prazo de prescrição do
procedimento contra-ordenacional por violação da obrigação estabelecida no
número anterior.
3 — Incumbe às
empresas que oferecem serviços de acesso à Internet ou serviços de comunicações
interpessoais acessíveis ao público provar que o utilizador final autorizou a
realização do pagamento dos bens ou serviços de terceiros que lhe hajam sido
cobrados, nos termos do n.º 1, sob pena de não lhe poderem exigir esse
pagamento ou, no caso de este já ter sido realizado, deverem restituir o valor
cobrado.
4 — Em caso de
conflito entre o disposto no presente artigo e o disposto no regime jurídico
dos serviços de pagamento e moeda electrónica, prevalecerá o disposto neste
último.”
Não se esqueça: para
substituir um artigo da Lei 24/96
sobre contactos telefónicos, o legislador aprovou um diploma legal com 11 artigos que são uma autêntica
confusão.
Muito se proclama.
Nada se concretiza. Tudo se tumultua. A qualidade das leis que se vêm
segregando é deplorável!
Em meio a uma tal
algaraviada, que conclua quem quiser o que lhe aprouver.
Mário Frota
presidente emérito
da apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal