ARTIGO
REGIONAIS
(Semana de 04 de Novembro de 2024)
Um
estudo encomendado pela Direcção-Geral do Consumidor, em tempos, à Universidade
Nova de Lisboa oferece-nos dados surpreendentes: 70% dos consumidores, ó suma
ignorância, consideram-se bem informados dos seus direitos e cerca de 90% dos
empresários também…
Não
sabemos se esta gente “anda a mangar co’a tropa”, mas se não anda, parece!
Estarão os consumidores deveras cientes
dos seus direitos?
O
que sabe o consumidor sobre as regras que regem a compra e venda de consumo?
Questão
suscitada por um consumidor, vítima da sua ignorância e, quiçá, da oficina de
marca a que recorreu:
“Expirada a garantia de um veículo usado,
adquirido em Fevereiro de 2022, sobreveio um problema na caixa de velocidades.
Mandei-o à marca para reparação. Cinco meses depois, vi-me a braços com a mesma
pane. Nova reparação, nova factura, esta de 478€ + IVA.
Disseram-me
que por cada uma das reparações há uma garantia de seis meses. Se assim for,
fui levado porque a avaria ainda estava na garantia.
Pergunto:
há mesmo uma garantia de seis meses nestes casos?”
Há
patente equívoco quando se alude a uma garantia por reparação de seis meses
fora do normal procedimento da compra e venda de consumo.
Na
compra e venda de consumo, ao accionar-se a garantia, “em caso de reparação, o
bem reparado beneficia de um prazo … adicional de seis meses por cada [uma das]
reparaç[ões] até ao limite de quatro …, devendo o profissional, aquando da
entrega do bem reparado, transmitir ao consumidor essa informação.” [DL 84/2021:
n.º 4 do artigo 18].
Os
seis meses adicionais de garantia só se observam nas hipóteses de compra e
venda em que ocorra reposição de conformidade mediante reparação do bem - novo,
recondicionado ou usado.
Não
há, por conseguinte, qualquer garantia de seis meses por eventual reparação
autónoma fora do quadro da garantia legal.
O
que há é uma garantia de três anos nas prestações de serviço, já que o regime
da compra e venda de consumo se aplica também:
“a)
…aos contratos celebrados para o fornecimento de bens a fabricar ou a produzir;
b)
Aos bens fornecidos no âmbito de um contrato de empreitada ou de outra prestação
de serviços, bem como à locação de bens, com as necessárias adaptações”
[DL 84/2021: als. a) e b) do n.º 1 do art.º 3.º].
Ora,
tratando-se de uma prestação de serviços, a garantia legal da compra e venda é
aplicável a qualquer reparação (contanto se trate do ponto específico objecto
de intervenção): “O profissional é responsável por qualquer
[não] conformidade que se manifeste no prazo de três anos a contar da entrega
do bem” [DL 84/2021:
al. a) do n.º 1 do art.º 12].
A
reparação inicial está coberta pela garantia, razão por que intervenção
subsequente não é susceptível de pagamento: a reparação é-o «a título gratuito», livre
dos custos necessários incorridos para repor os bens em conformidade, nomeadamente
o custo de … transporte, mão-de-obra ou materiais” [DL 84/2021: al. a) do art.º
2.º].
Nem
sequer o preço pode ser expresso, nas relações jurídicas de consumo, em (478 €
+ IVA), já que preço “é o preço total em que se incluem todos os impostos,
taxas e encargos que [nele se repercutam]”, constituindo contra-ordenação grave
uma tal formulação [DL138/90: n.º 6 do art.º 1.º; n.º 1 do art.º 11; DL 9/2021:
al. b) do art.º 18].
Constitui
crime de especulação o exigir-se preço indevido pela reparação: o crime de especulação é passível
de pena de prisão de seis meses a três anos e multa não inferior a 100 dias [DL
28/84: art.º 35].
Daí
que deva exigir da oficina da marca, para além do cumprimento da garantia
legal, a devolução do montante
indevidamente pago, denunciando à ASAE, órgão de polícia criminal, tais factos
para a instrução dos autos.
O
que dizem as leis quanto à informação a prestar?
Um
só exemplo.
Lei
da Compra e Venda de Consumo (art.º 50):
“Capacitação
dos consumidores
A
Direcção-Geral do Consumidor promove acções destinadas a informar os
consumidores sobre os direitos resultantes do presente decreto-lei e os meios
adequados ao seu exercício, em articulação com as demais entidades competentes.”
Esta
é uma exigência da União Europeia para que os consumidores saibam em que lei
vivem.
Tais
ditames estarão a ser cumpridos? Cremos que não.
Que
quem de direito se pronuncie!
Mário
Frota
presidente emérito da apDC
– DIREITO DO CONSUMO - Portugal