De uma consumidora, a
questão: “fui abordada por uma empesa de cartões de crédito para fazer um contrato.
Não aceitei. Deixei, porém, o meu contacto para poder analisar de futuro a
situação. Contudo, passaram a ligar-me insistentemente de número anónimo, mesmo
depois de lhes ter dito que não estava interessada.
Ripostaram que “como lhes
dei o meu contacto, dei o consentimento para ligarem sempre com promoções”.
É mesmo assim?”
Apreciada a factualidade,
cumpre então responder:
A Lei dos Serviços
Financeiros à Distância, aplicável à concreta hipótese de facto, dispõe de
norma própria, sob a epígrafe “comunicações não solicitadas”, que reza o que
segue:
“1 - O envio de mensagens
relativas à prestação de serviços financeiros à distância cuja recepção seja
independente da intervenção do destinatário, nomeadamente por via de sistemas
automatizados de chamada, por telecópia ou por correio electrónico, carece do
consentimento prévio do consumidor.
2 - O envio de mensagens
mediante a utilização de outros meios de comunicação à distância que permitam
uma comunicação individual apenas pode ter lugar quando não haja oposição do
consumidor manifestada nos termos previstos em legislação ou regulamentação
especiais.
3 - As comunicações a que
se referem os números anteriores, bem como a emissão ou recusa de consentimento
prévio, não podem gerar quaisquer custos para o consumidor.” (DL 95/2006: art.º
8.º).
A sanção para uma tal
contra-ordenação orça algo na ordem dos € 2500 a € 1 500 000
(pessoa colectiva): competente para o efeito é o Banco de Portugal (DL 95/2006:
al. b) do art.º 35 e art.º 37).
Se retomarmos, porém, os
termos de recente parecer [de 2022] da Comissão Nacional de Protecção de Dados,
no que se prende com o SPAM, em geral, teremos:
“1. O envio de
comunicações para marketing directo
pode fazer-se nas seguintes condições:
a. Se já existe uma relação de clientela e:
(i) Se o marketing respeita a produtos ou
serviços análogos aos adquiridos anteriormente pelo cliente, não é necessário o
seu consentimento; mas tem de ser garantido o direito de oposição, no momento
da recolha dos dados e em cada uma das mensagens enviadas;
(ii) Se o marketing respeita a produtos ou
serviços diferentes dos adquiridos anteriormente pelo cliente, apenas com o
consentimento prévio e expresso do cliente.
b. Se não existe uma
relação jurídica prévia entre o responsável e o destinatário, apenas com o
consentimento prévio e expresso do titular dos dados.
02. O responsável deve
ainda manter uma lista actualizada de pessoas que manifestaram expressamente e
de forma gratuita o consentimento para a recepção deste tipo de comunicações,
bem como dos clientes que não se opuseram à sua recepção.
03. O ónus da prova de que
foi prestado consentimento e em que condições, bem como de que foi garantido o
direito de oposição, recai sobre o responsável pelo tratamento dos dados.
04. O consentimento do
titular tem sempre de ser informado, específico, livre, inequívoco e expresso,
o que significa que o titular tem de consentir que uma determinada entidade,
devidamente identificada, lhe envie comunicações de marketing directo dos seus
produtos e serviços.”
…
Não existe, com efeito,
uma relação jurídica, mas uma mera relação de facto. E ainda que houvesse uma
relação jurídica anterior, perante a
oposição da consumidora teriam de cessar de imediato os contactos, sob pena de
responderem pela sua ousadia de neles persistir.
A violação de tais termos,
em geral, constitui contra-ordenação passível de coima de 5 000 a 5 000 000 €, de harmonia com o que prescreve o artigo 14 da
Lei 41/2004, de 18 de Agosto.
A denúncia deve ser
efectuada à CNPD - Comissão Nacional de Protecção de Dados,
a que caberá a instrução dos autos e a inflicção das coimas que à violação
quadrarem.
No entanto, para
situações análogas, soluções quantitativamente diferentes (de 2.500 € a
1 500 000 € e de 5 000 € a 5 000 000 €).
E ninguém olha para
diferenças tão abissais… para harmonizar sanções.
Mário Frota
presidente
emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal