Uma
reclamação como tantas outras.
Uma aberração
como poucas.
Um alheamento
dos poderes públicos que vergasta os indefesos consumidores.
Um “é fartar,
vilanagem!” apropriado à situação.
Como actor
principal, o antigo monopólio, hoje nas mãos dos chineses com o beneplácito de
antigos ministros, com o Estado empalmado e os nacionais e os mais de cócoras
perante o arbítrio, a iniquidade e a prepotência…
Eis os termos
da reclamação dirigida pela consumidora, titular do contrato, à EDP COMERCIAL:
“Até 16 de Outubro de 2023
a facturação ter-se-á efectuado por estimativa, o que parece não se justificar
já que a fracção se acha dotada de um instrumento de medição inteligente com
leituras directas de banda do comercializador.
Desde 16 de Outubro de 2023
(155,56 €: ft. 3400…) que as leituras são reais , o que vem duplicando de mês a
mês o montante a pagar.
Assim,
§
ft. 3400… (de 16 de Outubro a 14 de Novembro de 23)
- €155,56
§
ft. 3400… (de 14 de Novembro a 14 de Dezembro de
23) – €352,26
§
ft. 3400… (de 15 de Dezembro de 23 a 14 de Janeiro
de 24) - €597,12
(Novembro:
os ocupantes da fracção nem sequer em casa estiveram durante parte substancial
do mês e o consumo restringiu-se ao frigorífico).
Ora, tais valores
constituem um descalabro para a economia doméstica e para os equilíbrios dos
orçamentos familiares e são, com efeito, incomportáveis.
Não se tem a garantia de
que mesmo os valores mais recentes correspondam a consumos efectivos e a um
encontro de contas que é de todo desvalioso para uma habitação em que coabitam
dois anciães, com pronunciados hábitos de economia, e que são brindados com
estes valores astronómicos que põem em causa o direito à protecção dos
seus interesses económicos, constitucionalmente consagrado.
Alerto a EDP COMERCIAL para
tão estranho fenómeno e agradeço se me prestem os esclarecimentos devidos
porque estou, com efeito, a ser lesada na minha posição como consumidora mercê
de métodos pouco lícitos de apresentação das facturas e da mensuração dos
consumos que têm de ser sistemática e pontualmente reais que não dessa forma à
toa, consoante os apetites dos serviços e dos seus bizarros sistemas.”
A constituição consagra o
princípio da protecção económica dos consumidores.
Como corolário, em defesa
do orçamento doméstico, o de que “o
consumidor tem de pagar só o que consome na exacta medida do que e em que
consome”.
Nem mais nem menos…
Ora, quando se viola
flagrantemente o princípio e se fere de morte o equilíbrio dos orçamentos
domésticos, há uma arma que está ao alcance do consumidor: recusar-se pura e
simplesmente a pagar, reclamando.
Se de Vila Real a Vila Real
de Santo António, de Figueira de Castelo Rodrigo à Figueira da Foz, os
portugueses e os mais aqui radicados procedessem desta forma, as empresas logo
se socorreriam de expedientes para obstar à quebra de receitas de tesouraria. E
talvez o panorama se alterasse
Já que ninguém tem sequer a
assistência nem do Regulador - A ERSE –
nem, por hipótese, da Provedoria de Justiça, a que recorremos em recuado ano,
denunciando situações do jaez destas que são recorrentes, de ocorrência mensal
e atingem milhões de famílias, sem
sucesso.
À Provedoria de Justiça
para que suscitasse perante o Tribunal Constitucional, dada a legitimidade em
que está investida, a inconstitucionalidade das normas em que se funda a
facturação por estimativa.
E a resposta da provedora
adjunta, Teresa Anjinho, deixou-nos siderados: não seria nem oportuno nem
conveniente fazê-lo (suscitar a inconstitucionalidade da facturação por
estimativa) porque em 2027 (leu bem: 2027) todos os lares estariam dotados de
contadores inteligentes com leitura ao segundo...
Provedor, traidor,
dir-se-ia numa adaptação de um velho adágio italiano.
Se o Provedor de Justiça se
rege por princípios de oportunidade e conveniência que não pelo da legalidade,
é mais um aliado de uma administração relapsa e contumaz, que castiga os
cidadãos e os consumidores , que não a tábua de salvação de que se valem os
injustiçados ávidos de justiça (seja lá isso o que for)!
O que se passa em Portugal
parece já não ter remédio!
A menos que os consumidores
terçam armas pelos seus interesses e usem o “boicote” generalizado como forma
de obstar a que estes sistemas ruinosos lhes dêem cabo da vida…
Solidariedade para com as
vítimas. Mas que se deixem de passividades e ajam: boicote à facturação por estimativa!
Mário Frota
presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal