(24
de Novembro de 23: Diário ‘As Beiras’, Coimbra)
PRIORIDADES
PARA A RYANAIR… NEM QUE ‘A VACA TUSSA’!
“Uma promotora de Justiça
do Estado de Pernambuco, indagava há dias, no Recife, em evento sobre Direitos
do Consumidor, da existência, em Portugal, de uma lei de prioridades de pessoas
com deficiência, insuficiências outras e descapacidades, já que no Aeroporto de
Lisboa, ao reclamar “preferência legal”, no embarque, dado o seu estado de
saúde, o balcão da Ryanar lhe objectou que “só se pagasse”!
E, com efeito,
exemplificou, havia duas filas: a dos que pagaram para ter prioridade no
embarque e a dos demais passageiros, ainda que idosos e com outras
insuficiências, que eram corridos para a “vala comum”…”
Ante a factualidade, eis o que cumpre opinar:
1.
Portugal também tem, à semelhança do
Brasil, um normativo que versa sobre um tal tema: o DL 58/2016, de 29 de Agosto.
2.
O seu artigo 3.º, sob a epígrafe “Dever de
prestar atendimento prioritário”, reza o seguinte:
1
- Todas as pessoas, públicas e privadas, singulares e colectivas, no âmbito do
atendimento presencial ao público, devem atender com prioridade sobre as demais
pessoas:
a)
Pessoas com deficiência ou incapacidade;
b)
Pessoas idosas;
c)
Grávidas; e
d)
Pessoas acompanhadas de crianças de colo.
2
- Para os efeitos estabelecidos no presente decreto-lei, entende-se por:
a)
«Pessoa com deficiência ou incapacidade», aquela que, por motivo de perda ou
anomalia, congénita ou adquirida, de funções ou de estruturas do corpo, incluindo
as funções psicológicas, apresente dificuldades específicas susceptíveis de, em
conjugação com os factores do meio, lhe limitar ou dificultar a actividade e a
participação em condições de igualdade com as demais pessoas e que possua um
grau de incapacidade igual ou superior a 60 % reconhecido em Atestado
Multiúsos;
b)
«Pessoa idosa», a que tenha idade igual ou superior a 65 anos e apresente
evidente alteração ou limitação das funções físicas ou mentais;
c)
«Pessoa acompanhada de criança de colo», aquela que se faça acompanhar de
criança até aos dois anos de idade.
3
- A pessoa a quem for recusado atendimento prioritário, em violação do disposto
nos números anteriores, pode requerer a presença de autoridade policial a fim
de remover essa recusa e para que essa autoridade tome nota da ocorrência e a
faça chegar à entidade competente para receber a queixa …”
3.
A lei, ainda que com os conceitos
indeterminados com que se apresenta, existe. Só que, ao que parece, não se
cumpre… Parece poder significar-se que a Lei Ryanair (a “promulgada” pela empresa) se sobrepõe
à Lei da República!
4.
Jorge Sampaio, presidente da República
decesso, punha na ‘boca de um amigo’ algo que tinha como realidade
indisfarçável: “as leis em Portugal são mera sugestão, não imperam, não mandam,
não obrigam…” E, com efeito, em inúmeras circunstâncias, a realidade parece não
desmentir tão perturbante asserção.
5.
“Qualquer pessoa a quem for recusado atendimento
prioritário… pode apresentar queixa junto das entidades competentes” (DL 58/2016:
art.º 5.º).
6.
A queixa a pode ser apresentada
6.1.
No Instituto Nacional para a Reabilitação;
6.2.
Na entidade reguladora, ou em qualquer
outra a cujas competências inspectivas ou sancionatórias se encontre sujeito o infringente.
7.
A coima para facto tão grave é irrisória,
a saber, contra-ordenação económica leve: tratando-se de uma grande empresa
(250 ou mais trabalhadores, como é o caso), de € 1.500 a € 12 000. O facto
é que esta violação é frontal e afecta milhões de passageiros.
8.
NO ensejo, sugere-se se accione a RYANAIR,
em acção inibitória, e se requeira uma indemnização correspondente aos
prejuízos causados aos passageiros incursos na lista de prioridades,
sistematicamente precluídos nos seus direitos.
EM
CONCLUSÃO:
a. Portugal
tem lei de prioridades no atendimento em estabelecimentos públicos e privados
(DL 58/2016).
b. A
violação da Lei das Prioridades no Atendimento constitui contra-ordenação
económica leve (DL 58/2016: artigo 8.º).
c. A
coima correspondente, tratando-se de grande empresa (250 ou mais trabalhadores)
é irrisória: de 1.500 a 12 000 €(DL 58/2016: art.º 8.º; DL 9/2001: al. a) s.al. v) do art.º 18).
d. A
denúncia da violação da lei deve ser apresentada à entidade reguladora ou
inspectiva a que se subordine o infringente (DL 58/2016: art.º 6.º).
Este é , salvo melhor juízo, o nosso parecer.
Mário Frota
presidente da apDC
– DIREITO DO CONSUMO -, Portugal