Em país avesso a uma
cultura da informação, surpreendem-nos os dados de um recente estudo acerca da
“literacia” dos consumidores, com a chancela da Universidade Nova, algo que à
generalidade das gentes terá naturalmente escapado…
Ao arrepio do que a
Comissão Europeia vem revelando, Portugal “desfruta de um lugar ao sol” neste
horizonte baço que vem toldando o nosso quotidiano.
Cerca de 70% dos
consumidores, conclui o estranho estudo, afirmam achar-se convenientemente
informados dos direitos que preenchem o seu estatuto.
Se se considerar que
temos 30% da população esmagada entre os limiares da miséria e da pobreza, ou
seja, em rigor, 30% de não consumidores, bem se pode ufanar o país porque
atinge o pleno: é que 70% correspondem, afinal, a 100% de consumidores.
De entre os empresários
(e responsáveis por empresas) os dados “revelados” são bem mais reconfortantes:
cerca de 90% juram a pé firme que conhecem o ordenamento jurídico dos
consumidores e as leis que o enformam.
A informação é direito
fundamental do consumidor, di-lo a Constituição da República, no n.º 1 do seu
artigo 60.
A informação tem, na
Lei-Quadro de Defesa do Consumidor de 1996, em vigor, expressão num dos seus artigos
(o 7.º):
E, no entanto,
consumidores e contribuintes, que garantem o funcionamento da extensa rede de
estações de radiodifusão áudio e audiovisual na órbita do Estado, não vêem
consagrado no quotidiano o serviço que jamais se instituiu:
Incumbência do Estado,
Regiões Autónomas e Municípios é a de desenvolver
acções e adoptar medidas tendentes à informação em geral do consumidor.
Mediante que tipo de
acções?
§ Criação
de serviços municipais de informação ao consumidor;
§ Criação
de bases de dados e arquivos digitais, de âmbito nacional, para difusão de
informação geral e específica, tanto de acesso restrito aos serviços como de acesso incondicionado,
dirigidos em geral ao consumidor (de
modo descodificado)
§ Subvenção
de acções e campanhas de informação desencadeadas pelas associações de
consumidores autênticas, autónomas e genuínas.
O serviço público de
rádio e de televisão deve reservar espaços, em termos que a lei definirá, para
a promoção dos interesses e direitos do consumidor.”
O Estado (a
Administração), aos costumes, diz invariavelmente: “nada”!
E, desde a primeira das
leis, adoptada não em 1974, mas em 1981, 42 anos depois, o artigo de que se
trata é autêntica “LETRA MORTA”!
Já o que rege a
informação em particular (o 8.º) permanece, quantas vezes, omisso, tal o
descaso verificado neste particular:
“O fornecedor de bens
como o de serviços deve, tanto nos preliminares como na celebração do contrato,
informar de modo claro, objectivo e
adequado o consumidor …, nomeadamente sobre características, composição e preço
do bem ou serviço, bem como sobre o período de vigência do contrato, garantias,
prazos de entrega e assistência após o negócio jurídico e consequências do não
pagamento do preço do bem ou serviço.”
…
§ Se
ocorrer ausência de informação, informação insuficiente, ilegível ou ambígua
que comprometa a utilização adequada do bem ou do serviço, o consumidor goza do
direito de retractação do contrato relativo à sua aquisição ou prestação, no prazo
de sete dias úteis a contar da data de recepção do bem ou do [início] da
prestação de serviços.
§ O
fornecedor de bens ou de serviços que viole o dever de informar responde pelos
danos que causar ao consumidor, sendo solidariamente responsáveis os demais
intervenientes na cadeia da produção à distribuição que hajam violado igualmente
o dever de informação.
O incumprimento do dever
de informação sobre as consequências do não pagamento do preço do bem ou
serviço determina a responsabilidade do fornecedor pelo pagamento das custas
processuais devidas pela cobrança do crédito.
Claro que este triste
estado de coisas se arrasta desde sempre com o criminoso descaso dos sucessivos
governos e administrações.
Até quando?
Mário Frota
presidente emérito da apDC
– DIREITO DO CONSUMO -
Portugal