Só em 2015 pela Resolução 70/186, votada a 22 de Dezembro, a Assembleia Geral das Nações Unidas deu o devido relevo ao consumo sustentável, enunciando princípios e emanando directrizes.
Nela se define consumo sustentável como “a satisfação das necessidades de bens e serviços das gerações presentes e futuras de tal modo que sejam sustentáveis do ponto de vista económico, social e ambiental.”
E estatui um princípio básico de responsabilidade: “compartem-na todos os membros e organizações da sociedade”.
Nela se diz que “os consumidores informados, os Estados Membros, as empresas, os sindicatos e as organizações ambientais e de consumidores desempenham um papel relativamente importante nesse particular”.
O que se pretende prevenir é a obsolescência precoce ou a obsolescência programada.
“A obsolescência prematura é, na sua essência, a pré-determinação deliberada do ciclo de vida de um produto. Como se, ao nascer, se inscrevesse, na sua matriz, a concreta data da sua morte com assinalável antecedência face à sua longevidade corrente. Como se o produto, no momento do lançamento no mercado, se fizesse acompanhar já de uma certidão com uma data de óbito próxima… em antecipação do seu curso regular de vida.”
A Lei-Quadro de Defesa do Consumidor vigente estabelece, de modo congruente com o que se vem proclamando em tema de sustentabilidade, que
“É vedada ao fornecedor de bens ou ao prestador de serviços a adopção de quaisquer técnicas que visem reduzir deliberadamente a duração de vida útil de um bem de consumo a fim de estimular ou aumentar a substituição de bens ou a renovação da prestação de serviços que inclua um bem de consumo.” (Lei 24/96: n.º 7 do art.º 9.º).
E, socorrendo-nos do tipo legal de crimes sobre fraude sobre mercadorias, é adequado enquadrar tais práticas ma moldura que segue:
“Quem, com intenção de enganar outrem nas relações negociais, fabricar…, vender ou puser em circulação por qualquer outro modo mercadorias de natureza diferente ou de qualidade e quantidade inferiores às que afirmar possuírem ou aparentarem, será punido com prisão até 1 ano e multa até 100 dias, salvo se o facto estiver previsto em tipo legal de crime que comine pena mais grave.” (DL 28/84: al. b) do n.º 1 do art.º 23).
Em França, porém, o Código do Consumo (code de la consommation) prescreve no seu artigo L 441-2:
“É proibida a prática da obsolescência programada, definida pela utilização de técnicas, incluindo software, através das quais o responsável pela colocação de um produto no mercado visa reduzir deliberadamente o seu tempo de vida.”
As penas para os infractores são, com efeito, muito severas: prisão até dois anos e multa de € 300 000.
A multa pode ser aumentada até 5% do volume de negócios anual da empresa, dependendo dos lucros que de uma tal prática fraudulenta advenham.
Teremos, pois, de perspectivar com olhos de ver uma tal prática porque a obsolescência programada representa uma gravame para a sociedade. E instalou-se, entre nós, “com armas e bagagens”.
Que as autoridades que superintendem no mercado não permitam que tais práticas se precipitem na impunidade, como a conhecemos em Portugal.
Porque ao dar-se menos vida às coisas, dá-se, como vimos sustentando, menos vida à vida…
Mário Frota
presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal
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