Assédio
é, pode afirmar-se com segurança, no plano legal, “toda e qualquer situação em que ocorra um comportamento indesejado,
relacionado [ou não] com o sexo de uma
dada pessoa, com o objectivo ou
o efeito de violar a sua dignidade e de criar um ambiente intimidativo, hostil,
degradante, humilhante ou ofensivo”.
O assédio surge, em
tempos bem mais recentes [2019], no ordenamento locatício com um enquadramento
próprio e a noção que dele se traça é próxima da esboçada:
“[Entende-se] como tal qualquer comportamento
ilegítimo do senhorio, de quem o represente ou de terceiro interessado
na aquisição ou na comercialização do locado, que, com o objectivo de provocar
a desocupação do mesmo, perturbe,
constranja ou afecte a dignidade do arrendatário, subarrendatário ou das
pessoas que com estes residam legitimamente no locado, os sujeite a um ambiente intimidativo, hostil, degradante,
perigoso, humilhante, desestabilizador ou ofensivo, ou impeça ou prejudique
gravemente o acesso e a fruição do locado.”
Assédio:
vocábulo de origem controversa, oriundo provavelmente do latim absedius
– assento, lugar – ou do latim obsidium – cerco, cilada –,
consolidado no latim vulgar adsedium – situar-se à frente,
cercar, não se afastar – tem como significado, hoje em dia, a insistência de
alguém para que se faça algo que, em verdade, não se deseja.
Assédio
é,
com maior propriedade, segundo os dicionários, “insistência impertinente,
perseguição,
sugestão
ou pretensão
constantes em relação a alguém.”
E assediar significa perseguir com propostas, sugerir
com insistência; ser inoportuno ao tentar obter algo; molestar; abordar
súbita ou inesperadamente.
É vulgar ouvir-se falar
de assédio no plano sexual, como no moral.
A figura surgiu, em
tempos, sob novos influxos, no domínio dos contratos
de consumo. Com absoluta pertinência e justificação. Como surgira já no
plano da proibição da discriminação, mormente com reflexos na esfera
negocial, pela Lei 14/2008, de 12 de Março, em resultado, aliás, da Directiva
2004/113, de 13 de Dezembro, que o define assim:
“todas as situações em que ocorra
um comportamento indesejado, relacionado com o sexo de uma dada pessoa, com o
objectivo ou o efeito de violar a sua dignidade e de criar um ambiente
intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou ofensivo”.
Porém, o assédio,
enquanto tal, é susceptível de configurar um ilícito de mera ordenação social
[uma contra-ordenação] passível de coima e sanções acessórias, nos termos
da Lei das Práticas Comerciais Desleais
de 26 de Março de 2008 [DL 57/2008: artigo 11.º e alínea c) do artigo 12.º]:
“São consideradas
agressivas em qualquer circunstância:
Fazer solicitações
persistentes e não solicitadas,
por telefone, fax, e-mail ou qualquer outro meio de comunicação à distância,
excepto em circunstâncias e na medida em que tal se justifique para o
cumprimento de obrigação contratual.”
Moldura
sancionatória para contra-ordenação grave :
·
Microempresa (< 10 trabalhadores) - de 1 700,00 a 3 000,00 €;
·
Pequena empresa (10 a 49 trabalhadores) - de 4
000,00 a 8 000,00 €;
·
Média empresa (50 a 249 trabalhadores) - de 8 000,00 a 16 000,00 €;
·
Grande empresa (> 250 trabalhadores) – de 12 000,00 a
24 000,00 €.
Mas o assédio é também recoberto pela moldura
de um tipo legal de crime, sob a
epígrafe “perseguição”, previsto e
punido pelo artigo 154-A do Código Penal, que reza assim:
“1 - Quem, de modo reiterado, perseguir ou assediar outra
pessoa, por qualquer meio, directa ou indirectamente, de forma adequada a
provocar-lhe medo ou inquietação ou a prejudicar a sua liberdade de
determinação, é punido com pena de prisão até 3 anos ou pena de multa,
se pena mais grave não lhe couber por força de outra disposição legal.
2 - A tentativa é
punível.
3 - Nos casos previstos
no n.º 1, podem ser aplicadas ao arguido as penas acessórias de proibição de
contacto com a vítima pelo período de 6 meses a 3 anos e de obrigação de
frequência de programas específicos de prevenção de condutas típicas da
perseguição.
4 - A pena acessória de
proibição de contacto com a vítima deve incluir o afastamento da residência ou
do local de trabalho desta e o seu cumprimento deve ser fiscalizado por meios
técnicos de controlo à distância.
5 - O procedimento
criminal depende de queixa.”
Com efeito, para que se
possa afirmar estar-se perante assédio,
há-de pressupor-se habitualidade ou reiteração,
insistência, actos consecutivos; não basta um ou dois contactos, mas algo de
nutrido, de continuado, de repetido no tempo.
Mário Frota
Presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal