E
se o que for enviado
Sem
haver qualquer pedido
Vier
a ser reclamado
Não
tem de ser devolvido
Nem
por tal o preço pago!
Prática que persiste
em usar-se é a da remessa de bens
sem que os consumidores o solicitem.
Mas com ulterior exigência de pagamento do preço.
E há quem caia na
“esparrela” e entenda pagar, satisfazendo a pretensão do fornecedor. E por
pruridos outros que não cabe analisar na circunstância.
Convém dar a saber ao
vulgo o que dizem sucessivas leis, enquadráveis na mancha do Direito do Consumo:
1. Em primeiro
lugar, a Lei-Quadro de Defesa do
Consumidor (LDC).
A LDC, no n.º 4 do
seu art.º 9.º, estabelece imperativamente:
“O consumidor não
fica obrigado ao pagamento de bens ou serviços que não tenha prévia e
expressamente encomendado ou solicitado, ou que não constitua cumprimento de
contrato válido, não lhe cabendo, do mesmo modo, o encargo da sua devolução ou
compensação, nem a responsabilidade pelo risco de perecimento ou deterioração
da coisa.”
2. Em seguida, a Lei das Práticas Comerciais Desleais de 2008 (DL 57/2008, de 26 de
Março), na alínea f) do seu artigo 12, prescreve:
“São consideradas
agressivas, em qualquer circunstância, as seguintes práticas comerciais: …
Exigir o pagamento
imediato ou diferido de bens e serviços ou a devolução ou a guarda de bens
fornecidos pelo profissional que o consumidor não tenha solicitado, …”.
3. A Lei
dos Contratos à Distância e de Outras Práticas Negociais de 14 de Fevereiro
de 2014 reza, no seu artigo 28, sob a epígrafe bens não solicitados:
“1 - É proibida a
cobrança de qualquer tipo de pagamento relativo a fornecimento não solicitado
de bens, água, gás, electricidade, aquecimento urbano ou conteúdos digitais ou
a prestação de serviços não solicitada pelo consumidor…
2 - Para efeitos do
disposto no número anterior, a ausência de resposta do consumidor na sequência
do fornecimento ou da prestação não solicitados não vale como consentimento.”
3. E a Lei do Acesso e Exercício de Actividades de Comércio, Serviços e
Restauração (DL 10/2015, de 16 de Janeiro) estabelece especificamente, no
que tange a alimentos e bebidas não solicitados, no seu artigo 135 o que segue:
“1 - Nos
estabelecimentos de restauração ou de bebidas devem existir listas de preços,
junto à entrada do estabelecimento e no seu interior para disponibilização aos
clientes, obrigatoriamente redigidas em português, com:
a) A indicação de
todos os pratos, produtos alimentares e bebidas que o estabelecimento forneça e
respectivos preços, incluindo os do couvert, quando existente;
b) A transcrição do
requisito referido no n.º 3.
2 - Para efeitos do
disposto no presente artigo, entende-se por couvert o conjunto de alimentos ou
aperitivos identificados na lista de produtos como couvert, fornecidos a pedido
do cliente, antes do início da refeição.
3 - Nenhum prato,
produto alimentar ou bebida, incluindo o couvert, pode ser cobrado se não for
solicitado pelo cliente ou por este for inutilizado.
...”
5. O que quer significar exactamente a
última expressão, já que há muito quem faça uma enorme confusão a tal propósito?
É que não pode ser
cobrado qualquer prato, produto alimentar ou bebida, incluindo o couvert, se
cliente o não solicitar. Ainda que o coma. Ou que o inutilize.
Se se entender
cobrar qualquer valor, seja em que circunstância for, comete o empresário o
crime de especulação, previsto e punido pela Lei Penal do Consumo (DL 28/84, de
20 de Janeiro: artigo 35), cuja moldura é a de pena de prisão de 6 meses a 3
anos e de multa não inferior a 100 dias. Para além da contra-ordenação,
passível de coima e sanção acessória que, consoante as circunstâncias, pode
implicar montantes algo elevados.
Mário Frota
apDC – DIREITO
DO CONSUMO - Portugal