Diz de modo amplamente sugestivo a publicidade de uma
das insígnias da grande distribuição alimentar:
“Cereja
embalada a 3,49 €…”
Palavras
como cerejas
Contos
a que acrescem pontos
E
assim nos “apedrejas”
E
nos deixas meio tontos…
Que
o que rende
É
“enganar” a gente!
Diz,
com efeito, a publicidade, em voz “off”, precedida de imagens ilustrativas:
“Cereja
embalada a 3,49 €…”
E onde está o logro, o
engano?
É que, diz a lei dos
preços, a unidade de medida é o quilo: e, no caso, é de embalagens de meio
quilo (algo que de todo se não revela na palavra), em imagens atractivas, que
se trata...
E o peso vem grafado a
letras miudinhas no suporte, que não é detectável a olho nu.
Dá-se a entender que é da
unidade de medida que se fala e de que se exibe o preço: mas a unidade de
medida é o quilo e não metade, ou seja, meio quilo.
O consumidor tem de
acreditar só em metade do que dizem e dobrar sistematicamente o
preço anunciado? É essa a nova “técnica” adoptada pelas agências de
publicidade, agora que o crime da “reduflação” está na moda?
Não se olvide que, em
dados termos, a reduflação é crime de fraude sobre mercadorias, a despeito do
que para aí propalam “certos senhores”, numa tentativa de dourar a pílula…
Ou é de esperteza saloia
que se trata, como se infere desta “montagem”? Mas lá que cai sob a teia da publicidade
enganosa, não parece restarem dúvidas
Diz o Código da
Publicidade (que remete neste passo, no seu artigo 11, para a o artigo 7.º Lei
das Práticas Comerciais Desleais, no quadro das práticas enganosas):
“1 - É enganosa a [publicidade]
que contenha informações falsas ou que, mesmo sendo factualmente correctas, por
qualquer razão, nomeadamente a sua apresentação geral, induza ou seja
susceptível de induzir em erro o consumidor em relação a um ou mais dos
elementos a seguir enumerados e que, em ambos os casos, conduz ou é susceptível
de conduzir o consumidor a tomar uma decisão de transacção que este não teria
tomado de outro modo:
…
d) O preço, a forma de
cálculo do preço ou a existência de uma vantagem específica relativamente ao
preço; …”
Ora, a Lei dos Preços (DL 138/90, de 26 de Abril), a
propósito de unidades de medida de referência, reza no n.º 1 do seu artigo 3.º
o seguinte:
“Relativamente aos géneros alimentícios, o preço da unidade de medida
referir-se-á:
a)
Ao litro, no que diz respeito aos
géneros alimentícios comercializados por volume;
b)
Ao quilograma, quando diz respeito aos géneros
alimentícios comercializados a peso.”
E, no que tange, à publicidade, a lei é expressa ao
aludir, no seu artigo 6.º, exactamente sob tal epígrafe, o que segue:
“1 - A publicidade, sempre que mencione
preços de bens ou serviços, deve … indicar de forma clara e perfeitamente
visível o preço total expresso em moeda com curso legal em Portugal, incluindo
taxas e impostos.
2 - A publicidade escrita ou impressa e
os catálogos […], quando mencionem o preço de venda dos géneros alimentares e
produtos não alimentares …, devem igualmente conter, nos mesmos termos do
número anterior, a indicação do preço da unidade de medida…”.
Logo, é de um embuste que se trata: para
além do que se consigna na lei, toda a gente pensa ainda no quilo (e no litro)
como unidades de referência e, não, em 488 gr, 532 gr, ou 619 gr…
As agências de publicidade andam tão
falhas de imaginação que enveredam por estes prpocessos? É desse modo que
cumprem o seu código deontológico?
Não há limites na forma de atrair os
consumidores para os produtos que se anunciam?
E as autoridades demitem-se de intervir
só porque estamos perante insígnias de enorme poder e projecção?
Os consumidores merecem mais. Merecem,
sobretudo, que os tratem com dignidade que não a golpes de franca menoridade e
supina desconsideração…
É que os preços atraem as pessoas. E,
depois de se acharem no interior dos estabelecimentos, detectado o logro, não levam
aqueles artigos porque a preços exorbitantes (o dobro do anunciado, à exaustão,
no pequeno ecrã), mas levam outros, indistintamente…
Cumpra-se a lei. Para que não sejam só
vítimas dela os merceeiros da esquina que não têm desafortunadamente, passe a
expressão, “onde cair mortos”…
Mário Frota
presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal