sexta-feira, 2 de agosto de 2024

CONSULTÓRIO DO CONSUMIDOR


 RESOLUÇÃO… SEM EXCEPÇÃO! É O ‘DIREITO DE REJEIÇÃO’, ESTÚPIDO!

 “Adquiri um frigorífico de grande extracção, para uso pessoal, num estabelecimento muito badalado, no Retail Park, em Taveiro.

Nem 15 dias esteve a funcionar. Levei-o à loja. E, por já não ter confiança na marca, quis devolvê-lo. Recusaram-se a recebê-lo, pois agora, segundo eles, a lei manda, primeiro, reparar, depois substituir e, só depois disso feito, é que, remanescendo  o defeito, se pode então devolver.

É isto o que a lei diz?”

 Apreciada a factualidade, cumpre emitir opinião:

1.    Há, com efeito, na Lei Nova,  uma espécie de hierarquia nos remédios previstos: Lei da Compra e Venda dos Bens de Consumo – LCVBC (DL 84/2021: art.º 15).

 2.    “Em caso de [não] conformidade do bem, …, o consumidor tem direito:

 

 a)    À reposição da conformidade, através da reparação ou da substituição do bem;

b)    À redução proporcional do preço; ou

 c)    À resolução do contrato.

 3.    “O consumidor pode escolher entre a reparação ou a substituição do bem, salvo se o meio escolhido para a reposição da conformidade for impossível ou, em comparação com o outro meio, impuser ao profissional custos desproporcionados, tendo em conta todas as circunstâncias, incluindo:

 

a)    O valor que os bens teriam se não se verificasse a falta de conformidade;

b)    A relevância da falta de conformidade; e

 c)    A possibilidade de recurso ao meio de reposição da conformidade alternativo sem inconvenientes significativos para o consumidor.”

4. “O consumidor pode escolher entre a redução proporcional do preço, …, e a resolução do contrato, …, caso:

            a) O profissional:

i) Não tenha efectuado a reparação ou a substituição do bem;

ii) Não tenha efectuado a reparação ou a substituição do bem…;

iii) Tenha recusado repor a conformidade dos bens nos termos do número anterior; ou

iv) Tenha declarado, ou resulte evidente das circunstâncias, que não vai repor os bens em conformidade num prazo razoável ou sem grave inconveniente para o consumidor;

b) A falta de conformidade tenha reaparecido apesar da tentativa do profissional de repor os bens em conformidade;

c) Ocorra uma nova falta de conformidade; ou

d) A gravidade da falta de conformidade justifique a imediata redução do preço ou a resolução do contrato de compra e venda.

     5.    “A redução do preço deve ser proporcional à diminuição do valor dos bens que foram recebidos pelo consumidor, em comparação com o valor que teriam se estivessem em conformidade.”

    6.     “O consumidor não tem direito à resolução do contrato se o profissional provar que a falta de conformidade é mínima.”

    7. No entanto, há uma excepção à regra do encadeamento hierárquico se a não conformidade (vício, defeito, avaria, divergência entre a oferta e o bem fornecido…) ocorrer nos 30 dias a seguir à entrega do bem.

8. Rege o artigo 16, sob a epígrafe “direito de rejeição”: o consumidor pode rejeitar o bem de que se trata, enveredando directamente pela resolução do contrato (extinção do negócio em causa) com a devolução do bem e a restituição do preço pago:

“Nos casos em que a falta de conformidade se manifeste no prazo de 30 dias após a entrega do bem, o consumidor pode solicitar a imediata …  resolução do contrato.”

9. Logo, neste caso não há que observar qualquer hierarquia: a opção pela resolução (a saber, a extinção do contrato) cabe ao consumidor: não há que aguardar pela reparação, não há que observar qualquer precedência.

10. Resolver aqui não tem o significado de “encontrar a solução para determinado problema” nem o de “tomar determinada decisão”, mas o de “desligar, libertar-se”, “pôr termo ao contrato”…

EM CONCLUSÃO

a.     Se a não conformidade ocorrer nos 30 dias subsequentes à entrega do bem, é direito do consumidor pôr desde logo termo ao contrato mediante a devolução da coisa e a restituição do preço (LCVBC: art.º 16)

 b.    Não há que observar qualquer hierarquia nos remédios por lei previstos.

 c.     Não é lícito ao fornecedor impor a reparação em detrimento da resolução (da extinção), se for essa a opção do consumidor.

 d.    O consumidor pode lançar mão do Livro de Reclamações e socorrer-se dos bons ofícios do Tribunal Arbitral de Conflitos de Consumo, sediado em Coimbra.

 Tal é, salvo melhor juízo, o nosso parecer.

 

Mário Frota

presidente emérito das apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal

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