terça-feira, 30 de março de 2021

PORTUGAL: onde as tesouras fazem das suas… É ‘cortar’, vilanagem!

(Portal do PROCON RS, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, publicado hoje, 30 de Março de 2021)

  Ó vil 'ruço' de "má" pêlo...

Que neste passo desdouras

Ocupa-te só do cabelo...

No mais... "fora" com as tesouras!

 

“As empresas de energia eléctrica têm a faca e o queijo na mão. Sempre que os consumidores não paguem a factura mensal, cortam o fornecimento. ‘Sem mais nem aquelas’…

 É estranho que assim seja! Mas não haverá a possibilidade de manter o fornecimento, efectuando-se a cobrança por outros meios?

 De tão habituados a esta violência, já nem admitimos que possa haver outras soluções.”

 Ter a faca e o queijo na mão, é isso, afinal!

 Com efeito…

 O Código Civil vigente em Portugal, no n.º 1 do seu artigo 428, sob a epígrafe “excepção de não cumprimento”, estabelece imperativamente o que segue:

 “Se nos contratos bilaterais não houver prazos diferentes para o cumprimento das prestações, cada um dos contraentes tem a faculdade de recusar a sua prestação enquanto o outro não efectuar a que lhe cabe ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo.”

 Cremos que é este o preceito que habilita, por lei, o fornecedor a cortar o fornecimento enquanto o consumidor não efectuar o pagamento.

 Mas a suspensão do serviço não pode fazer-se, é certo, abusivamente, sem aviso prévio.

 O que nem sempre se observa, como é do conhecimento geral.

 Com efeito, a lei estabelece determinados requisitos para o efeito, caso o consumidor não pague no tempo e no lugar próprios:

 • A suspensão só pode ocorrer após ser advertido, por escrito, com a antecedência mínima de 20 dias em relação à data agendada para o efeito;

 • Da advertência, para além do motivo da suspensão, devem constar os meios de que consumidor se pode socorrer para evitar a suspensão do serviço e para a sua retoma.

 • O serviço não pode ser suspenso pela falta de pagamento de qualquer outro serviço, ainda que incluído na mesma factura, a menos que se trate de algo que lhe esteja intrinsecamente ligado.

 As comunicações electrónicas têm um outro regime.

 Aparentemente mais favorável. De que falaremos noutra ocasião.

 O facto é que os serviços públicos essenciais deveriam conhecer um regime distinto, dada a natureza dos produtos e serviços neles implicados: a água e o saneamento são direito humano; o acesso às energias tende a sê-lo; no quadro das comunicações electrónicas, a internet já foi considerada, em dados termos e de análogo modo, direito humano pelas Nações Unidas.

 Países há, como é o caso da França, em que é proibido “cortar a energia” de 1 de Novembro a 31 de Março do ano subsequente. Por razões óbvias. É o período de maior aperto do frio. Final de outono e o período de inverno, conquanto haja primaveras com temperaturas bem baixas.

 Parece uma solução pensada. Bem arquitectada. De aplaudir. E, o que é mais, de seguir.

As empresas terão de lograr a cobrança por outros meios. Sem que o incumprimento conduza a eventual corte. Há que evoluir, há que afinar pelos padrões civilizacionais mais avançados.


 Talvez as entidades reguladoras, no uso dos poderes que lhes cabem, possam equacionar a hipótese de criação de tribunais arbitrais necessários para cobrança de dívidas e só para este efeito.

 Que os mais funcionam para finalidades outras no quadro dos serviços públicos essenciais, cabendo o impulso processual ao consumidor e só ao consumidor, que não ao fornecedor.

 A factura da luz é, em geral, incomportável para a generalidade das famílias, por mais que poupem.

 A energia eléctrica em Portugal é um enorme peso para os orçamentos domésticos.

 E nem as maquilhagens do Orçamento do Estado (que, em Dezembro pretérito baixou o Imposto sobre Valor Acrescentado, que nem sequer regressou aos mínimos de antanho após o brutal aumento protagonizado pela Tríade Internacional que governou Portugal após a bancarrota em que um tal Sócrates lançara o País) farão baixar a factura na generalidade das situações.

 Porque razão Portugal não copia os bons modelos e continua a bater nos métodos estafados que se afastam dos direitos humanos, como se concebem nas nações civilizadas?

 Uma boa questão para os deputados da Nação e para o Parlamento.

 Normalmente, valha a verdade, de costas para os consumidores.

 Por ora, em razão do surto pandémico que assolou o País em começos de Março do ano pretérito, a proibição dos cortes, de modo, aliás, justificável, perdurará até ao termo do primeiro semestre do ano em curso (Lei do Orçamento do Estado para 2021: n.º 1 do art.º 361).

 Depois, com as economias das famílias em baixa, logo se verá!

 

 Mário Frota

apDC- DIREITO DO CONSUMO - Coimbra


 Projecto com o apoio do Fundo do Consumidor

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