A Águas
do Alto Minho, S.A., que se substituiu aos municípios da região na gestão
das águas, está apresentar aos consumidores facturas de anos recuados, cuja
cobrança as câmaras terão negligenciado, o que está a gerar ali uma forte onda
de protestos.
Será normal que facturas de há vários anos, que
os consumidores nem sequer sabem já se terão pago ou não, se apresentem a
pagamento?”
1. A
prescrição, nos serviços públicos
essenciais, é de seis meses (Lei
23/96: artigo 10.º).
1.1.
prazo de prescrição conta-se da data do fornecimento, que corresponde
ao da emissão regular da factura (de periodicidade mensal).
1.2. Para
que a prescrição possa valer, impõe-se que o consumidor a invoque, judicial ou extrajudicialmente. Sob pena de, em princípio,
tal lhe não aproveitar (Código Civil: art.º 303).
2. A
prescrição de curto prazo, como é o caso, livra o consumidor do cumprimento
judicial da dívida. A dívida extingue-se. Fica residualmente uma obrigação natural.
2.1. E
obrigação natural é a que se “funda”, como diz a lei, “num mero dever de ordem
moral ou social, cujo cumprimento não é judicialmente exigível...”
2.2. A
prescrição libera, liberta o consumidor, por isso se diz que é liberatória. Extingue a dívida, que não
poderá ser judicialmente exigível.
2.3. É
direito do consumidor. Não se trata de aproveitamento ilícito. É ditada por
razões de segurança jurídica. Que se prendem, no caso, com o equilíbrio dos
orçamentos domésticos. E para punir a inacção do fornecedor. Que dispõe de seis
meses para cobrar voluntariamente ou propor a respectiva acção de dívida ou
requerer a respectiva injunção.
3. Para
além da prescrição, importa referir ainda a figura da caducidade do direito do recebimento da diferença do preço (caso se
facture menos que o consumido e se entenda recuperar, mais tarde, a diferença)
que é também de 6 meses (Lei 23/96: n.º 2 do artigo 10.º)
4. Independentemente
destas duas figuras, a lei prevê inteligentemente que “ o prazo para
a propositura da acção ou da injunção é de seis meses”. Ou seja, institui aqui a figura da “caducidade do direito de acção”.
5. Ora,
a acção (ou a injunção) caduca, cai se proposta (requerida) para além dos seis
meses do fornecimento do produto.
6. E
a caducidade é, neste passo, de
conhecimento oficioso, isto é, deve o tribunal conhecê-la sem necessidade de
invocação pelo interessado, pela conjugação de dois dispositivos da lei (Lei
23/96: art.ºs 10.º e 13.º).
7. Se,
proposta a acção (ou requerido o procedimento de injunção) mais de 6 meses após
a prestação do serviço, o tribunal considera que a acção caiu, não pode
naturalmente prosseguir, o que faz com que a prescrição deixe de ser invocada
(porque só o seria na contestação ou oposição – a peça do processo ou
procedimento em que o demandado deduz a sua defesa).
8. A
caducidade do direito de acção como
que desconsidera a prescrição que, a não ser invocada, nem mesmo assim deixará
de produzir os seus efeitos (ou seja, os da inexigibilidade judicial da dívida,
limpando-a de todo, com o que se disse acerca da tal “obrigação natural”).
EM
CONCLUSÃO:
1. Decorridos
seis meses sobre a regular remessa das facturas que correspondem ao período
dentro do qual o fornecimento se processa, prescrevem
as dívidas da água como dos demais serviços públicos essenciais, em que se
conta a água.
2. Subsiste
uma residual obrigação natural, por
não poder ser judicialmente exigível a dívida prescrita.
3. A
remessa de facturas com dívidas prescritas, sem mais, como se as dívidas fossem
judicialmente exigíveis, constitui acto
em patente má-fé, proibido por lei e
susceptível de impor uma indemnização ao consumidores pelos danos daí
decorrentes.
Mário Frota
apDC – DIREITO
DO CONSUMO - Coimbra
Projecto com o apoio do Fundo do Consumidor