Se
o consumidor se recusar a pagar uma qualquer factura por ter invocado, a justo título, a prescrição, não pode daí advir
qualquer desvantagem, nomeadamente:
.
nova exigência de pagamento;
.
suspensão do serviço;
.
extinção do contrato;
.
exigência de caução ou outras garantias para poder continuar a processar-se o
fornecimento ou a prestação de serviço;
.
recusa de celebração de um outro contrato…
O
fornecedor não pode retaliar, como parece estar a acontecer entre nós.
O
fornecedor não pode negar a continuidade do serviço, como o estabelecem
princípios e normas.
A
prescrição, nos serviços públicos essenciais, é de seis meses.
E
o prazo conta-se da data do fornecimento.
E,
para valer, o consumidor tem de a invocar, judicial ou extrajudicialmente. Sob
pena de tal lhe não aproveitar. Como manda, aliás, o art.º 303 do Código Civil:
“O
tribunal não pode suprir, de ofício, a prescrição; esta necessita, para ser
eficaz, de ser invocada, judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem
aproveita, pelo seu representante ou, tratando-se de incapaz, pelo Ministério
Público.”
A prescrição
de curto prazo, como é o caso, livra o consumidor do cumprimento judicial da
dívida. A dívida extingue-se. Fica residualmente uma obrigação natural.
E
obrigação natural é a que se
“funda”, como diz a lei, “num mero dever de ordem moral ou social,
cujo cumprimento não é judicialmente exigível...”
A
prescrição libera, liberta o consumidor, por isso se diz que é liberatória. Extingue a dívida.
É
direito seu. Não se trata de aproveitamento ilícito. É ditada por razões de
segurança jurídica. Que se prendem com o equilíbrio dos orçamentos domésticos.
E para punir a inacção do fornecedor. Que dispõe de seis meses para cobrar
voluntariamente ou propor a respectiva acção de dívida.
Ora,
depois de invocada a prescrição, um escritório de advogados ao serviço de uma
das operadoras de comunicações, em Portugal, ousa interpelar de novo os
consumidores para que paguem. E fá-lo de forma ridícula, mas que colherá
naturalmente os seus frutos, ante a ignorância geral que se observa neste
partiocular.
Tal
aconteceu em tempos a um consumidor de
Coimbra (por sinal, antigo advogado) que jamais fora cliente da NOS que lhe
reclamara uma dívida de 2010. Alegou inexistência, arguindo, porém, à cautela,
a prescrição, não fosse o diabo tecê-las…
Depois
disso, nova interpelação da “sociedade de advogados”!
Eis
o teor de semelhante aberração jurídica:
“Relativamente
à questão da prescrição da factura, cumpre-me transmitir-lhe que é nosso
entendimento que a prescrição é um instituto jurídico que pode, uma vez
invocada, inviabilizar a cobrança judicial do valor, não extinguindo porém a
obrigação natural do pagamento.
Assim,
o pagamento no montante de €….,… deverá ser efectuado, nos próximos oito dias,
por cheque ou vale postal em nome de …, a enviar para a morada do meu
escritório, agradecendo-lhe a indicação do n.º de conta de facturação no verso
do documento, ou então, através do multibanco (pagamento de serviços),
utilizando os seguintes dados Ent. … e a Ref.ª…”
E
se o consumidor não pagar por, como se disse, se ter extinguido a dívida?
Recorrem,
como está a acontecer, em flagrante litigância
de má-fé, ou às injunções ou ao Procedimento de Pré-Execução, com
inenarráveis prejuízos para as vítimas que intentarem defender-se ou que
negligenciarem a oposição a estes procedimentos ilícitos.
Não
se ignore que a caducidade do direito de acção é também de 6 meses, o
que significa que acção ou injunção proposta para além de tal prazo cai,
caduca, não tem sequer pernas para andar.
E a caducidade
é, neste passo, de conhecimento oficioso, isto é, deve o tribunal conhecê-la
sem necessidade de invocação pelo interessado.
Sendo
, em bom rigor, de conhecimento oficioso, a CADUCIDADE
DO DIREITO DE ACÇÃO como que absorve
a prescrição que, a não ser invocada, nem mesmo assim deixará de produzir
os seus efeitos (ou seja, os da inexigibilidade judicial da dívida, limpando-a
de todo).
E
assim vai o “direito”… no Reino dos atropelos!
Aos
consumidores restará, em tais casos, em Portugal, sempre que interpelados,
instaurar antecipadamente uma acção de simples apreciação negativa nos tribunais
arbitrais, a fim de barrar as acções ou injunções que as operadoras,
por si só ou por interposição dos cobradores
de fraque, venham a instaurar.
Mário Frota
apDC – DIREITO
DO CONSUMO - Coimbra